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quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A Identidade - Milan Kundera (Livro)

A Identidade de Milan Kundera. Lançado em 1997. Tradução de Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca. São Paulo. Companhia das Letras, 2009.



Meu primeiro contato com a obra do escritor tcheco Milan Kundera foi através do já clássico A Insustentável Leveza do Ser, livro que causou um impacto enorme em minha percepção sobre aquilo que sou e principalmente sobre a maneira com a qual lido com meus sentimentos. Desde que o li pela primeira vez, há cerca de um ano, tenho percebido reflexos do que foi dito pelo autor em quase todas as áreas de minha vida. Nenhuma outra obra literária provocou em mim reações tão intensas e marcantes e, como valorizo autores capazes de me proporcionar este tipo de imersão, fui logo em busca de outros escritos de Kundera e foi assim que cheguei até A Identidade, obra não tão grandiosa, mas tão bela e profunda quanto a primeira que li.

Em A Identidade, que foi escrito em 1997, podem ser percebidos diversos elementos que estão presentes também em A Insustentável Leveza do Ser, dentre eles as reflexões acerca da sexualidade, a dor existencial e o estudo minucioso do comportamento humano, realizado através da construção psicológica de cada um dos personagens. Pela maneira cuidadosa com que apresenta e desenvolve cada um deles, Kundera, de uma forma poética e cheia de sensibilidade, nos leva à identificação com alguns de seus pensamentos e atitudes e à medida em que ele ensaia reflexões sobre a história contada, somos instigados a refletir sobre a nossa própria condição.

Em A Identidade, Chantal é uma publicitária de meia idade que começa a viver uma crise ao perceber que não é mais desejada pelos homens como fora um dia, ela não quer se envolver com nenhum dos estranhos, cujos olhares cobiça, o que ela deseja é sentir-se ainda capaz de acender a libido dos desconhecidos, como se a atenção devotada por eles fosse uma espécie de confirmação de que ela ainda não perdeu aquilo que acredita ser a sua essência, sua identidade.


Quando já estava tomada pela melancolia, Chantal começa a receber cartas anônimas de um admirador que conhece sua rotina e acompanha seus passos, estas correspondências reascendem nela o amor próprio e um tesão que há muito ela não sentia. Curiosamente, o assédio do desconhecido dá um novo gás para o relacionamento de Chantal com Jean-Marc, seu segundo marido. Este já vinha percebendo há algum tempo a dor que ela dissimulava, porém sem saber o fazer para ajudá-la, ele sabia que todo seu amor e carinho já  não eram o suficiente para ela. 

No decorrer da história, uma atitude bem intencionada, quase inocente, desencadeia uma série de acontecimentos que atenua a dor existencial sentida por Chantal, levando-a a profundas reflexões sobre sexualidade e a natureza do amor. Ela se vê dividida entre a rotina segura e tranquila que leva ao lado de seu esposo e uma vida de aventuras sexuais com estranhos capazes de satisfazer sua maior necessidade, a de se reencontrar com uma parte de si mesma que já não mais existia. Esta dicotomia conduz a personagem à uma decadência psicológica que faz com que sua noção do que é de fato real se torne cada vez mais fragilizada. 

A Identidade consegue, em suas poucas páginas, transcender a história que conta, se tornando desta forma muito mais que um romance. Não seria exagero afirmar que ele, assim como A Insustentável Leveza do Ser, é também um livro filosófico, nele as ponderações de Kundera sobre o a identidade que buscamos  adquirem tanta consistência que chegam bem próximo de constituir um ensaio sobre a limitação e a submissão do individuo frente aos inúmeros olhares alheios que estão direcionados ou não para si, ora punindo, cobrando-o, cobiçando-o, ou tão somente ignorando-o, forjando assim frágeis identidades que nem sempre condizem com o real...


Resenha publicada originalmente em 15/02/2013 no Blog Antes que Ordinárias!

2 comentários:

  1. Com certeza A insustentável leveza do ser é o melhor livro de Kundera, mas A identidade também parece interessante.

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