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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Melancolia

Melancolia (Melancholia) - 2011. Escrito e dirigido por Lars von Trier. Direção de Fotografia de Manuel Alberto Claro. Produzido por Meta Louise Foldager e Louise Vesth. Zentropa Entertainments, Memfis Film, e Liberator Productions / Dinamarca | Suécia | França | Alemanha.


É inexplicável a reação de estar diante de uma verdadeira obra de arte e sendo assim seria uma tarefa árdua tentar convencer do contrário qualquer um que tenha apontado Melancolia (2011) como um filme chato e carente de um bom roteiro. Ele foi pra mim precisamente o oposto disso. Se trata de mais um exemplar daquele tipo raro de produção, que subverte totalmente a ideia de que o cinema serviria tão somente como bom entretenimento. Os desavisados que esperavam do longa uma boa história sobre catástrofes naturais certamente saíram do cinema amargando uma baita decepção. Lars von Trier consegue se superar e me surpreender a cada filme, eu, que considerei Anticristo (2009) uma espécie de ápice criativo, fiquei boquiaberto da primeira à última sequência de Melancolia. Se seu filme anterior evocava o asco ao expor sem atenuantes o mais brutal da natureza humana, neste ele reproduz de forma quase palpável a mais profunda angústia existencial, condição que ele mesmo experimentou nos últimos anos.

Melancolia tem sua trama focada em alguns dias na vida de duas irmãs, Justine (Kirsten Dunst) e Claire (Charlotte Gainsbourg), como de praxe Lars von Trier divide o filme em capítulos e dedica cada um deles a uma das irmãs. O primeiro, intitulado "Justine", acompanha a festa de casamento da personagem, ela não está empolgada com a cerimônia e está alheia à tudo que acontece à sua volta. A irmã, o cunhado e outros convidados exigem de Justine uma adequação às formalidades da ocasião, mas ela não deseja, nem consegue, cumprir as normas de etiqueta social que lhe cobram. Ele está imersa em um profunda depressão e todo o lampejo de alegria que esboça não passa de mera fantasia social. Sua melancolia é agravada pelas dúvidas que ela tem acerca de seu casamento, ela visivelmente tenta de tudo para agradar seu noivo, o gentil Michael (Alexander Skarsgård), mas isso também não passa de uma reação superficial, sem uma real entrega aos estímulos oferecidos pelo meio.


A explicação para a aversão de Justine à tudo que está vivendo pode estar na relação de seus pais, que estão separados, sua mãe é uma mulher liberal que não acredita nem no casamento, nem na família, já o pai parece apenas aceitar toda a situação que está vivendo sem questionar ou reclamar. Creio que não é por acaso que o filme comece justamente em uma cerimônia de casamento, afinal não é de hoje que o cinema usa a família como alegoria para situações experimentadas pelo indivíduo e pela coletividade, o casamento fadado ao fracasso aponta para a decadência da família e da própria sociedade, situações que atenuam ainda mais a angústia existencial experimentada pelos indivíduos. Aqui está um ponto chave do filme, o sofrimento e suas consequências seriam algo inerente à condição humana, algo comum a todos os indivíduos, o que varia é apenas a forma com que cada um reage a isso.


A segunda parte do filme, "Claire", direciona o foco para a segunda irmã, é neste capítulo que é anunciada a possível catástrofe, um planeta (isso mesmo, um planeta), chamado Melancholia está em rota de colisão com a Terra. Cientistas defendem que não acontecerá um choque entre os dois planetas, não havendo portanto com o que se preocupar, mas teorias diversas se espalham pela internet e Claire se expõe à elas. Ao contrário do que poderíamos esperar, é Claire, e não Justine, quem se alarma com um possível fim do mundo. Seria este o fim da existência? Em um diálogo Justine afirma: “A Terra é má, não precisamos sentir pena dela... estamos sozinhos, a vida só existe na Terra e não por muito tempo...”. Na primeira parte do filme, Claire faz de tudo para reprimir as emoções da irmã, nesta é ela quem não consegue controlar aquilo que sente, ela é tomada pelo pânico e pelo medo de perder tudo aquilo a que está apegada.


O planeta que se aproxima não é um mero detalhe, mas é tão somente uma metáfora. Assim como os personagens e suas respectivas realidades não passam de alegoria do que seria de fato real. Para Lars apenas a dor é real e ela contagia cada um de seus personagens, nenhum deles fica ileso. No tocante à metáfora ilustrada pela aproximação do planeta, entendo que a pretensão do roteiro é construir uma associação entre a iminência de uma catástrofe e a forma com que nos relacionamos com a nossa dor e a nossa angústia. A melancolia de Justine a torna imune ao medo, pois ela não tem nada a perder, o fim do mundo significa, ao seu modo de ver, o fim do sofrimento. Já Clarie está completamente indefesa, pois é então que ela passa a ter noção de sua própria fragilidade, Melancholia então a assusta de uma forma bem diferente da dos outros personagens, seu marido, John (Kiefer Sutherland) se apóia na ciência para acalentá-la e para dissimular seu próprio temor.



Mais uma vez a ciência é a extensão da ignorância e da limitação humana, o que aponta para uma visão totalmente cética e niilista. O homem não pode confiar em Deus (estamos falando de Lars von Trier), não pode confiar em si mesmo, nem tão pouco na ciência... O que restaria seria apenas uma opção por se entregar à dor, sentimento que seria capaz de tornar o indivíduo mais forte, à medida que este estivesse exposto a ele. Percebe-se aqui mais um eco da filosofia de Nietzsche na obra de Trier (o roteiro de Anticristo também tem perceptível influência da obra deste pensador, conforme comentei na resenha crítica que fiz do filme), que se manifesta nesta ideia de que o sofrimento seria o estímulo capaz de livrar o indivíduo da sentença de pairar constantemente no ar, se distanciando da terra e do que seria a verdade experimentada. Esta condenação, da qual o homem é liberto, poderia leva-lo a se tornar um ser “semi-real”, sendo assim a dor seria o fardo que empurra para o chão, para a realidade.



O desfecho do filme, que muitos apontaram como o mais positivista de Lars von Trier, não passa, ao meu modo de ver, de mais uma piada do cineasta. Ele ironiza metaforicamente as ilusões criadas para trazer conforto e atenuar a dor que se sente. O filme termina e me sobra uma pequena dúvida, teria Justine transcendido sua condição melancólica e alcançado o ideal proposto por Nietzsche do “super-homem”? Na verdade encontrar a resposta para esta pergunta não é o mais importante, o que importa é ter chegado à ela. Reforçando sua condição de obra de arte, o filme nos conduz a esta reflexão e a tantas outras acerca de nossa natureza, de nossas relações sociais e de nossas angústias. Posso não concordar com esta visão, mas isso também não importa, o fato é que Melancolia é uma verdadeira obra prima, seja pela trama, pelas excelentes atuações ou pela belíssima fotografia. Sem dúvidas um dos melhores filmes deste ano, porém seria uma besteira recomendá-lo para todos...


Melancolia ganhou o prêmio de Melhor Atriz ( Kirsten Dunst) no Festival de Cannes.

Assista ao trailer de Melancolia no You Tube, clique AQUI !

Confira também aqui no Sublime Irrealidade a resenha crítica de
Anticristo, também escrito e dirigido por Lars von Trier!


domingo, 27 de novembro de 2011

Reino Animal

Reino Animal (Animal Kingdom) - 2010. Escrito e dirigido por David Michôd. Direção de Fotografia de Adam Arkapaw. Música Original de Antony Partos. Produzido por Liz Watts. Screen Australia e Porchlight Films / Austrália.


Se eu precisasse resumir minha experiência de ter assistido Reino Animal (2010) em apenas uma palavra, eu escolheria “decepção”... O filme tem boas atuações? Sim! A direção é precisa? Sim! Ele tem bons momentos de tensão? Sim! A visão melancólica e negativista e um fator positivo? Sim! Mas então o que teria feito o filme passar bem longe da expectativa que eu então criara? Penso que seja em parte por causa do roteiro, que apresenta algumas falhas quase gritantes e em parte pela badalação criada em torna da atuação de Jacki Weaver, que convenhamos, apesar de ser muito boa, se perde em meio à falta de uma base consistente que possa sustentar seu personagem. O filme marca a estreia do diretor e roteirista David Michôd, que não faz feio na direção, no entanto no roteiro ele se deixa levar pelo aspecto mais marcante da história, deixando assim de aparar algumas arestas, o que denota a carência significativa de uma linguagem mais amadurecida.

No início deste ano, quando o filme estava concorrendo ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, os olhares de críticos e cinéfilos se voltaram para ele, e não faltaram comentários exaltados, como o de que este seria uma espécie de O Poderoso Chefão de saias ou o de que a antagonista do filme seria uma das personagens mais odiáveis dos últimos tempos, pela sua sagacidade e crueldade. Na minha humilde opinião, ambas afirmações são completamente infundadas, para defender meu posicionamento, preciso apresentar meu ponto de vista acerca da trama do filme. Mas antes de tecer qualquer comentário sobre a história contada no longa, preciso, para não correr o risco de ser injusto, lembrar que se trata de um filme, que apesar das falhas, merece algum crédito por ter se originado fora do circuíto Hollywoodiano e por ter conseguido significativo sucesso nos festivais em foi apresentado e até mesmo no mainstrean da sétima arte.


A trama é construída em torno de uma família que está completamente envolvida com a criminalidade em uma cidade australiana. Toda a história é contada partindo da perspectiva de Joshua “J” Cody (James Frecheville), um jovem de 17 anos. Na primeira sequência do filme, ele perde a mãe vítima de uma overdose de heroína, sem outra alternativa ele pede a ajuda da avó, Janine “Smurf” Cody (Jacki Weaver), que o leva para morar com ela e os 3 tios dele, Andrew “Pope” Cody (Ben Mendelsohn), Craig Cody (Sullivan Stapleton) e Darren Cody (Luke Ford). Todos eles são extremamente perigosos e estão envolvidos com o tráfico local, com assaltos e outros crimes. Apesar de estar em família, “J” não consegue se tranquilizar nem botar um pingo sequer de confiança na avó e nos tios. Desde que ele era pequeno, sua mãe tentou o manter afastado da família dela, mas por sua própria causa ele estava agora sob a tutela de seus parentes.


O filme quase consegue ser brilhante ao estabelecer uma analogia entre a situação enfrentada por “J” e a lei da sobrevivência no mundo animal. Ele precisa se amparar em alguém mais forte para se manter a salvo, no entanto ele não sabe ao certo de quem precisa se salvar, se é da polícia ou se é de sua própria família. A situação piora quando Barry 'Baz' Brown (Joel Edgerton), um assaltante amigo da família, é morto por policiais. Pope, o mais velho dos tios de “J” é covarde e doentio, combinação que o torna bem mais perigoso que seus irmãos, é ele quem arquiteta um plano para vingar a morte de Baz. Numa emboscada, ele e os irmãos matam dois policiais que faziam a ronda noturna. É neste momento que o detetive sargento Nathan Leckie (Guy Pearce) aparece em cena, ele é a antítese perfeita daquilo que a família Cody representa, ele é ético, preza pela justiça e consegue manter um bom relacionamento familiar apesar do estresse e da responsabilidade inerentes ao seu trabalho.


Vamos então ao meu ponto e vista: O filme não deixa claro a gravidade dos crimes cometidos pela família Cody, mas a impressão que fica no fim das contas é a de que eles não passavam de bandidos pequenos, vagabundos metidos em pequenos delitos e não uma rede criminosa organizada, que justificasse a comparação com O Poderoso Chefão ou a mobilização policial que vemos no filme. Se por outro lado, tais crimes fossem assim tão graves, por que então eles não tinham sido pegos antes. Em um dado momento “J” comenta que um de seus tios seria capaz de cortar a garganta de alguém para não ser pego durante um assalto, tudo indica que, mesmo sendo capaz, ele nunca tinha feito isso. Não parametrizar as ações da família/quadrilha é a falha mais evidente de Reino Animal, mas ela não é a única. “J” é muito inocente para quem conviveu em um ambiente hostil com uma mãe drogada, à ponto de presenciar a morte dela por overdose. Outra dúvida surge, se ela, a mãe dele, queria realmente protege-lo de sua família, por que então não o protegia de si mesma?


A matriarca Smurf não mete tanto medo assim e como eu já disse ela é um personagem que carece de fundamentos. É atribuída a ela uma inteligência que ela não aparenta ter e sua crueldade é mais uma consequência do cerco que se fecha contra ela do que uma característica inerente à sua personalidade. No tocante às atuações, considero a de Ben Mendelsohn, superior a de Jacki Weaver, ele tem uma expressão facial fantástica e, apesar de ser o mais franzino dos irmãos, ele consegue pelo olhar provar que é um sujeito perigoso, que precisa ser temido. Se Smurf é a leoa que rodeia o bando para o proteger dos ataques de inimigos, ele é o leão que descontrolado é capaz de sacrificar a própria família para se manter vivo e escapar das garras de seu predador. Este personagem inserido em um roteiro melhor escrito poderia ter rendido um filme infinitamente melhor... Reconheço que Reino Animal não é um filme ruim, muito pelo contrário, como já disse ele tem bons momentos, porém ele me decepcionou...


Reino Animal recebeu o Grande Prêmio do Jurí – World Cinema no Festival de Sundance, o maior festival de filmes independentes dos Estados Unidos. O filme ainda recebeu indicações ao Oscar e ao Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante (Jacki Weaver).

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sábado, 26 de novembro de 2011

Hora de Voltar

Hora de Voltar (Garden State) - 2004. Escrito e dirigido por Zach Braff. Direção de Fotografia de Lawrence Sher. Música Original de Chad Fischer. Produzido por Pamela Abdy, Gary Gilbert, Dan Halsted e Richard Klubeck. Camelot Pictures / USA.


Ouvir uma música pela primeira vez. Voltar à cidade onde cresceu. Enterrar um porquinho da índia de estimação. Fazer algo que nunca fez antes. Estar em uma sala de espera de um consultório. Não saber nadar. Sentir saudades. Ter uma ideia original e ficar rico. Não saber o que fazer da vida. Encarar a culpa. Uma conversa na beira da lareira. Tomar conta de um abismo infinito. Dar um abraço protetor na pessoa amada. Ir a uma pedreira. Descobrir o sentido da vida. Simplesmente gritar... A banalidade da existência se torna fascinante pelo simples fato de estarmos perto de quem gostamos, Hora de Voltar (2011), a estreia de Zach Braff como diretor, é sobre isso. É sobre amor, sobre amizade e sobre perdão, principalmente sobre perdoar a si mesmo. Esta foi a terceira vez que assisti ao filme e o efeito dele sobre mim continuou o mesmo. Eu não tinha tido um dia legal quando o assisti pela primeira vez, mas de uma forma quase mágica ele me fez, não esquecer, mas olhar com outros olhos para tudo que eu estava vivendo. Não por acaso, eu não estava em um dos meus melhores momentos quando decidi o rever nas duas outras vezes.

Andrew Largeman (Zach Braff) tentou ser ator, mas fracassou, o único personagem pelo qual ele é lembrado é um portador de deficiência mental que interpretou em uma série de TV, tal reconhecimento nem sempre é positivo. Para ganhar a vida ele trabalha como garçom em um restaurante de comida vietnamita em Los Angeles, trabalho no qual não se sente nem um pouco motivado. A notícia da morte acidental da mãe faz com que Large volte para Garden State, a cidade onde nasceu e cresceu, ele passara mais de nove anos a exatos 4.827 quilômetros de distância da casa dos pais. Desde as primeiras cenas percebemos que Large é melancólico e tem um comportamento extremamente apático. Ele é dependente de lítio, medicamento prescrito para pacientes portadores de transtorno bipolar ou depressão. Já de antemão fica facilmente perceptível que o atual estado do rapaz é uma consequência de sua relação familiar. O medicamento que ele toma fora receitado pelo próprio pai, Gideon (Ian Holm), após um trauma vivido na infância.


Após o enterro da mãe, Large começa a reencontrar alguns de seus amigos de infância, dentre eles o coveiro Mark (Peter Sarsgaard), que tem uma família totalmente desajustada, Jesse (Armando Riesco) que ficou milionário após inventar e patentear um velcro silencioso e Kenny (Michael Weston), um ex-usuário de drogas que se tornou policial. Mark convida Large para uma festa em sua casa e este aceita o convite, pode parecer estranho ele ir a uma festa no dia em que sua mãe fora enterrada, mas ele parece estar completamente anestesiado, mesmo tendo parado com os remédios desde que saiu de Los Angeles. Na casa do amigo, o estado em que ele se encontra fica ainda mais evidente, ele experimenta drogas e mal consegue se levantar do sofá, passando quase toda a noite como um expectador daquilo que acontece à sua volta. O que se nota é que ele não está dando a mínima para si mesmo, para o que está sentido, ou para as pessoas à sua volta, é, como eu disse, a completa apatia.


Porém no dia seguinte, Large decide procurar um médico por causa de dores terríveis na cabeça, que ele já vinha sentindo a dias, esta consulta pode ser interpretada como uma tentativa dele de se livrar de tudo aquilo que seu pai lhe havia imposto até então. O médico conclui que ele não precisa tomar anti-depressivos e que seriam eles a causa de suas dores de cabeça. Ele sai completamente diferente do consultório, mas o que o mudou não foi o médico ou a consulta, foi o que aconteceu na sala de espera. Após uma sequência de acontecimento inusitados, Large consegue se interagir com uma garota que também estava lá, ela é Sam (Natalie Portman) uma mentirosa compulsiva (suas mentiras são quase inofensivas). Ela é praticamente o oposto dele, ela irradia alegria e esperança e seu alto astral é altamente contagiante. Ainda no consultório, em uma das cenas mais belas do filme, ele pergunta o que ela estava ouvindo, ela lhe empresta o fone e lhe apresenta à banda The Shins... A belíssima canção New Slang simboliza a quebra do gelo, a volta do sentir e da esperança a tanto perdida...


Tal como seus personagens, Hora de Voltar é cheio de imperfeições, mas estas não diminuem em nada sua maravilhosa capacidade de nos emocionar (continuo me emocionando a cada vez que escuto New Slang) e renovar em nós o brilho e o colorido da existência, que por vezes parece se esconder atrás de nossos medos, mesquinhez e falta de perdão. Zach Braff acertou em sua estreia como diretor principalmente por não tentar fazer nada de tão extravagante e tão extraordinário, a simplicidade do filme, alidada às ótimas atuações e aos personagens muito bem construídos, o tornam, não uma obra prima, mas algo extremamente belo e sensível, que precisa ser visto por todos, principalmente por aqueles que não acreditam que são capazes de serem felizes.


O principal destaque do filme fica por conta de Natalie Portman, ele está perfeita e linda como sempre. Não tem como não ser contagiado pela alegria estonteante de sua personagem, que consegue transformar o momento mais banal em uma experiência memorável. A trilha sonora, escolhida a dedo pelo próprio Zach, também é ótima e encaixa perfeitamente com o filme e com as sequências onde é utilizada. Dentre os temas estão canções do já citado The Shins, do Coldplay, do Zero 7 e de Simon & Garfunkel. Vale lembrar também a ponta feita pelo ator Jim Parsons, como o estranho Jim, que chega a lembrar seu personagem mais famoso, o Sheldon Cooper da série The Big Bang Theory. Se ao assistir ao filme, você experimentar metade do que senti em cada uma das três vezes que o vi, já terá valido a pena. Deixe passar algumas pequenas falhas e apenas aprecie a simplicidade e a autenticidade da história contada... Recomendo sem restrições o filme e a trilha sonora! O que está esperando, corra atrás!


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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A Árvore da Vida

A Árvore da Vida (The Tree of Life) - 2011. Escrito e dirigido por Terrence Malick. Direção de Fotografia de Emmanuel Lubezki. Música Original de Alexandre Desplat. Produzido por Brad Pitt, Grant Hill, Sarah Green e Dede Gardner. Brace Cove Productions, Cottonwood Pictures, Plan B Entertainment e River Road Entertainment / USA.


Os homens ensinaram que a vida segue dois caminhos, o caminho da natureza e o caminho da graça. Você tem que escolher qual dos dois irá seguir. A graça não atende a indulgências, atende ao desprezo, esquecimento, indiferença... aceita insultos e golpes. A natureza busca somente a sua satisfação e não a satisfação dos outros.

A graça e a natureza... Passei os últimos tempos imerso em profundas questões acerca do porquê de algumas situações que eu estava vivendo, confesso que não sei lidar bem com o sofrimento, tenho dificuldade de compreender e aceitar coisas que são inerentes à nossa existência. Diante de tais situações me rendi à uma das questões mais antigas da humanidade: “se Deus é amor, por que então ele permite o sofrimento?”.  Foi justamente neste período que me deparei com um passagem bíblica, que me incomodou durante meses, ela está no livro de Jó e diz “Porque ele faz a chaga, e ele mesmo a liga; ele fere, e as suas mãos curam”. Demorou para que eu chegasse perto de uma compreensão acerca de tudo isso e tal discernimento só potencializou o efeito que A Árvore da Vida (2011) exerceu sobre mim.


A reflexão que Terrence Malick propõe com esta película, resguardada as devidas proporções, é semelhante à esta que forçadamente experimentei. Fica evidente que o livro de Jó foi uma das principais fontes de inspiração para a construção da trama, que alegoriza de forma magistral o relacionamento entre o homem e Deus. Através de narrações e conduções de fluxo de pensamentos em off, personagens questionam suas próprias condições e a existência de um criador capaz de os ama-los e de os perdoar apesar de seus defeitos. A pequenez do ser humano diante da grandiosidade do universo é usada, assim como na história de Jó, para ilustrar o quão insignificante seria um indivíduo, diante de tudo que existe. Malick recorre a uma citação do livro bíblico para abrir o filme. Na passagem “Onde estavas quando eu lançava os fundamentos da terra”, é como se Deus, do alto de sua onipotência, colocasse Jó em seu devido lugar no universo, afinal quem era ele para questionar o angustiante silencio de seu criador.


O mais belo do filme, é a distinção que ele faz em sua trama entre a natureza e a graça. A natureza seria a condição original humana, que torna cada indivíduo egoísta e indiferente às questões alheias, já a graça seria uma espécie de completa doação, de total entrega ao outro, é a graça que definiria a relação entre Deus e os homens. Mas se Deus é gracioso, voltamos então à questão original, porque há sofrimento? A relação familiar dos O`Brien tenta nos guiar até a resposta, ou então à outras inúmeras questões envoltas no assunto. A Senhora O`Brien (Jessica Chastain), que alguns apontam como uma personificação da graça, é uma mãe cuidadosa e permissiva, ela zela pelo lar e se dedica, em total entrega, ao marido e à família. O Senhor O´Brien (Brad Pitt), diferente dela, é mais rigoroso, chegando a ser autoritário em alguns momentos, de acordo com a interpretação comum ele seria a personificação da natureza. Eu no entanto vejo de forma diferente, acredito que o casal seria na verdade a personificação de dois aspectos da natureza divina, de um lado o amor incondicional, cheio de aconchego, e de outro a disciplina, que apesar de sua dureza, seria guiada também pelo amor e pela graça.


No epicentro da história estão Jack (Hunter McCracken na infância), R.L. (Laramie Eppler) e Steve (Tye Sheridan), os filhos dos O`Brien, eles levam uma vida normal, semelhante a de qualquer outra criança fruto de uma família americana de classe média alta nos anos 50, eles passam o dia entre a escola e as brincadeiras no jardim e nas redondezas da enorme casa onde moram. Jack, o primogênito, passa a se sentir desprezado desde o nascimento do segundo filho do casal, mesmo sendo ainda muito pequeno, ele sente ciúmes do irmão e desenvolve um comportamento violento e arredio, o que seria ao meu ver a verdadeira personificação da natureza no filme. A trama reencontra Jack (Sean Penn na vida adulta) 50 anos mais tarde, ele se tornou um arquiteto bem sucedido, mas nunca superou a morte prematura de um dos irmãos. É o plantio de uma árvore no pátio do suntuoso prédio onde trabalha que o leva a mergulhar em reminiscências de sua infância.



A Árvore da Vida percorre um espaço de tempo ainda maior que o coberto por 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1968) de Stanley Kubrick, sua trama volta na criação do universo, mostrada à luz da teoria darwinista da evolução, para ao final chegar no que seria uma espécie de fim do mundo. O filme é todo preenchido com belíssimas imagens, captadas com uma sensibilidade estonteante, cada fotograma é simplesmente perfeito no tocante à fotografia e consegue provocar mais efeitos do que um diálogo normalmente poderia induzir. Nós espectadores somos conduzidos à uma viagem de sensações, sentimentos e filosofia, a qual eu não encontro nenhum similar á altura na história do cinema. Mas o filme não é apenas uma sequência de belas imagens, como alguns reducionistas taxaram, ele possui uma trilha sonora simplesmente maravilhosa e as atuações são poderosíssimas, Hunter McCracken merecia, na minha opinião, ao menos uma indicação ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, sua entrega ao personagem é impressionante.



Terrence Malick conseguiu realizar um filme que simplesmente beira a perfeição, ele é arte e filosofia da primeira á última sequência. A maestria do diretor fez com que o risco de que o filme se tornassem um panfletário religioso fosse definitivamente eliminado. Ao assistir ao filme percebe-se que em nenhum momento ele estará tentando “vender” uma determinada verdade, acerca dos temas que aborda, ele se torna desta forma similar a um livro de filosofia, cujo o interesse é mais provocar a reflexão acerca de determinado assunto do que apontar respostas definitivas. Para mim, assistir A Árvore da Vida foi uma experiência única e maravilhosa, que tentarei repetir em pouco tempo, antes que ela comece a se apagar de minha mente, no entanto não sei se posso indicar o filme para todos sem restrições. Apesar de não ser um filme de tão difícil compreensão, ele será melhor apreciado por aqueles que já estiverem familiarizados com o tipo de questionamento por ele levantado, creio que isso explique o porquê de ter ocorrido uma evasão maciça do público no meio da projeção, em diversas salas onde o filme foi exibido. Recomendo para aqueles que tenham sensibilidade o suficiente para apreciar uma verdadeira obra de arte!


A Árvore da Vida ganhou a Palma de Ouro, prêmio máximo do Festival de Cannes.

Assista ao trailer de A Árvore da Vida no You Tube, clique AQUI !

Confiram também aqui no Sublime Irrealidade a crítica de 
Além da Linha Vermelha,
também escrito e dirigido por Terrence Malick.


sábado, 19 de novembro de 2011

Submarine

Submarine - 2011. Dirigido por Richard Ayoade. Escrito por Richard Ayoade, baseado no romance de Joe Dunthorne. Direção de Fotografia de Erik Wilson. Música Original de Alex Turner e Andrew Hewitt. Produzido por Ben Stiller, Marj Herbert, Andy Stebbing e Mary Burke. Film4, Wales Creative IP Fund, Warp Films e Red Hour Films / UK | USA.


Fui convencido a assistir Submarine (2010), mais pela trilha sonora, que tem canções do Alex Turner, vocalista e guitarrista do Artic Monkeys e do The Last Shandow Puppets, do que por qualquer outra coisa. Não sabia sequer a sinopse do filme, quando um amigo me convidou para assisti-lo. Sem nenhum exagero, este filme foi uma das melhores coisas que poderia ter me acontecido naquela noite fria de ontem. De uma forma assustadoramente perfeita, o filme parecia estar em sintonia com meu estado de espírito e o resultado disso eu simplesmente não consigo explicar, só posso garantir que foi muito bom. O filme, apesar de não trazer nada de novo ou de tão excepcional, consegue ser cativante e tocar algo de sensível que temos dentro de nós e nos deixar com a alma à flor da pele e uma gostosa sensação ao final da exibição.

Certamente não é um filme que agradará a todos, mas é uma grande pedida para quem está com os olhares atentos à produção atual do cinema indie. Os atrativos são os mesmos presentes em outros filmes similares como Ghost Word (2001) e A Pequena Miss Sunshine (2006), e incluem personagens caricatos, dotados tanto de vícios quanto de virtudes, histórias não convencionais e uma pequena dose de experimentalismos. Creio que a maior vantagem deste tipo de filme seja a de que eles já nascem desprovidos da pretensão de agradar a todo mundo, o que dá maior liberdade de criação aos seus realizadores e ao elenco. De fato a despretensão é um dos trunfos de Submarine, que se apresenta como nada mais que um filme sobre descobertas e desventuras da adolescência, mas que consegue ir muito além de tudo isso, não pelos temas em que toca, mas pela forma com que os aborda.


Submarine é contado pela perspectiva de Oliver Tate (Craig Roberts), um garoto que está vivendo uma ebulição de sentimentos e sensações, típicos de sua faixa etária, ele tem poucos amigos na escola e sofre com o bulling por ser considerado diferente. Ele está apaixonado por Jordana Bevan (Yasmin Paige), uma menina tão estranha quanto ele, em suas palavras ela seria “uma garota moderadamente impopular, cujo único problema são os eczemas de pele”. A vida pode não está tão fácil para Oliver na escola, mas é em casa que ele se vê na obrigação de enfrentar problemas bem maiores. Seu pai, Lloyd Tate (Noah Taylor) se tornou depressivo e não percebe que seu casamento está preste a acabar, a mãe Jill (Sally Hawkins) tenta dissimular sua própria angústia e o fracasso de sua vida familiar a empurra para um relacionamento extraconjugal com Graham (Paddy Considine), um guru new age que se mudará para a vizinhança.


Oliver consegue conquistar Jordana, à princípio ela se aproxima dele apenas para se vingar de um ex-namorado que a traíra, mas com o tempo ela passa a admirá-lo, mesmo que dificilmente reconheça isso. Eles conseguem desenvolver um cumplicidade raramente vista, o que chega a incomodar os outros garotos da escola, que não acreditam em relacionamentos duradouros. O conflito que norteia a trama surge quando Oliver descobre que terá que escolher entre dar atenção para sua namorada, que tem problemas até mais graves que os dele, ou se dedicar a salvar o casamento dos pais, que dado o estado em que se encontra parece uma missão quase impossível. Os problemas se multiplicam principalmente porque Oliver são se abre, nem com Jordana, nem com seus pais, nem com mais ninguém.


A forma com que o roteiro brinca com as situações partindo da visão do personagem é a melhor sacada do filme, situações complexas como o perdão, a depressão e a perda não se tornam leves de uma hora para outra, mas ao menos se tornam mais fáceis de serem encaradas quando vistas pelo olhar de um adolescente cheio de criatividade e curiosidade. Em uma das sequências mais legais do filme, Oliver tenta imaginar como a notícia de sua morte repercutiria em meio aos seus colegas de escola, em outra cena ele enumera motivos que o possam impedir de desistir de sua própria vida, não passa de uma brincadeira, mas é no contexto da história uma clara evidência da forma com que o lar conturbado influencia na vida dele. As dores, os medos e incertezas que Oliver enfrenta o tornam muito mais que mero personagem de um romance adolescente, ele, Jordana e todos os outros personagens secundários são dotados de uma profundidade que vai muito além de suas falas, estando visível em suas atitudes, olhares e expressões.


As atuações de Craig e Yasmin merecem destaque à parte, apesar de jovens eles estão muito bem e apresentam desempenhos acima da média, em cada cena basta olhar para seus rostos para saber o que existe no mais profundo de seus personagens, tal fenômeno também ocorre cada vez que Noah e Sally entram em cena, mas no caso deles isso não é nenhuma novidade. A fotografia e as locações conferem ao filme um visual muito bonito e a direção de arte é impecável. Curioso, mas tal como o amigo com quem assisti ao filme comentou, Submarine parece atemporal, pois em nenhum momento fica claro em que época ele passa, pois apesar do visual retro que remete aos anos 60 ou 70, objetos e situações indicam que se trata de uma época mais próxima da atual, eu prefiro acreditar que isso foi proposital... A trilha sonora, como eu já esperava, é fantástica e cada uma das seis canções compostas por Alex Turner são belíssimas e casam perfeitamente com as cenas nas quais são encaixadas. Submarine é sem dúvidas uma ótima pedida. Recomendo!


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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Sem Medo de Morrer

Sem Medo de Morrer (The Life Before Her Eyes) - 2007. Dirigido por Vadim Perelman. Escrito por Emil Stern, baseado no romance de Laura Kasischke. Direção de Fotografia de Pawel Edelman. Música Original de James Horner. Produzido por Vadim Perelman, Aimée Peyronnet e Anthony Katagas. 2929 Productions / USA.


A despeito da opinião da crítica especializa, eu tenho que afirmar que Sem Medo de Morrer (2007) é um no mínimo um bom filme. Quando estreou com Casa de Areia e Névoa (2003), o diretor ucraniano, radicado nos Estados Unidos, Vadim Perelman conquistou respeito e muitos elogios, com um ótimo roteiro, excelentes atuações e uma direção precisa, seu primeiro filme arrebatou cinéfilos e críticos pelo peso e densidade de sua trama, mas esta é uma história para um outro post, o assunto de hoje é tão somente o seu segundo longa metragem. Sem Medo de Morrer não alcança o mesmo nível de qualidade de seu antecessor, mas isso não o torna um filme ruim. Se comparado a tanta coisa de qualidade duvidosa, que a crítica ovaciona de pé, eu até diria que ele é uma obra prima, no entanto a sensação que fica é a de que Perelman era capaz de ir ainda mais longe.

Penso que o que pode ter decepcionado parte do público que o assistiu tenha sido o ritmo no qual a história é desenvolvida, o filme sofre constante oscilações, indo da mais contemplativa lentidão ao mais visceral suspense em questão de segundos. Os mais desatentos não compreenderão a importância de algumas cenas e de alguns pequenos detalhes, mas são estes que no final das contas fazem toda a diferença. O filme é permeado, desde as primeira sequências até o final, por um sentimento pesado e doloroso, uma angústia que anuncia um final trágico, no entanto já conhecemos de antemão o desfecho, o que nos surpreende é a forma com que é feita a conclusão da história e é aí que está a melhor sacada do filme. Vou parar por aqui para não correr o risco de contar mais detalhes e assim diminuir de alguma forma o impacto causado pela obra.


Vamos então à sinopse: Diana (Evan Rachel Wood) é uma colegial que está vivendo uma espécie de rito de passagem para a vida adulta, ela é imediatista, insubmissa e está se afundando em um mergulho hedonista que inclui sexo e experimentação de drogas. Tudo isso que pode ser apontado como rebeldia, no caso dela é apenas imaturidade, ela não sabe o que quer para sua própria vida e a falta de um norte e de uma base não a incomoda nem um pouco. Sua melhor amiga Maureen (Eva Amurri) não poderia ser mais diferente dela, esta sabe o que quer para seu futuro, é responsável e não se deixa se levar pelas “maluquices” da amiga. Apesar da diferença de comportamento gritante, elas são inseparáveis na escola e fora dela. Elas estão prestes a terminar o ensino médio, quando algo acontece na escola.


15 anos se passam desde aquela primavera que anunciava a proximidade das férias de verão, somos então novamente apresentados para Diana (agora interpretada por Uma Thurman), ela se tornou professora de artes, se casou e teve uma filha, chamada Emma (Gabrielle Brennan), cujo comportamento lembra muito o seu quando era adolescente. Diana está angustiada com a proximidade da data na qual completariam 15 anos do ocorrido na escola, que mudara completamente o rumo de sua vida. Ela se mostra então mais frágil do que aparentava ser, ela passa a ser consumida pelo remorso do que acontecera em sua juventude. Ninguém a sua volta parece compreender a sua dor, nem o mesmo seu marido, que tem se tornado cada vez mais distante. A culpa e a pressão que ela impõe sobre si a faz perder em alguns momentos a noção de realidade, mas tudo pode ser apenas um ponte de vista, ou a vida passando diante dos olhos...


O filme possui um roteiro não linear que oscila entre o presente (Diana adulta) e o passado (Diana adolescente), a transição entre os espaços de tempo é bem feita, ponto para a montagem do filme. No entanto, visualmente, o que mais chama a atenção é a belíssima fotografia, Pawel Edelman o diretor responsável explora muito bem a luz solar e a iluminação natural, o que faz toda a diferença em locações abertas ao ar livre e mesmo em aposentos onde os raios de sol invadem trazendo ao ambiente uma claridade quase melancólica. Os pequenos detalhes como um minúsculo inseto sobre uma folha, ou a pétala em uma flor são meticulosamente fotografados, estes pequenos detalhes são crucias para que o filme seja, não só compreendido, mas também sentido pelo expectador.


Eu já vejo a Evan Rachel Wood como uma das melhores atrizes da nova geração de Hollywood, ela realmente tem talento, já Uma Thurman dispensa qualquer comentário, ambas estão muito bem no filme e conseguem dar consistência a personagem que interpretam (destaque também para semelhança física criada entre elas), Gabrielle Brennan também não faz feio e o elenco secundário, com algumas exceções, não deixa a peteca cair. Definitivamente não consigo apontar nenhum aspecto negativo tão significativo que justifique as tantas criticas ruins que o filme recebeu. Ele pode não ser um filme memorável nem uma obra prima, mas é sem dúvidas um filme que compensa ser assistido, principalmente pela contemporaneidade de alguns temas nos quais ele toca. Se tiver alguma oportunidade de vê-lo não a perca. Recomendo!


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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Os Infiltrados

Os Infiltrados (The Departed) - 2006. Dirigido por Martin Scorsese. Escrito por Willian Monahan, baseado no roteiro original de Siu Fai Mak e Felix Chong. Direção de Fotografia de Michael Ballhaus. Música Original de Howard Shore. Produzido por Graham King, Brad Pitt e Martin Scorsese. Warner Bros. Pictures / USA | Hong Kong.


Toda vez que me deparo com a notícia de que estão produzindo mais um remake de alguma obra de sucesso, a minha primeira reação é a desconfiança. Geralmente o erro cometido nessas situações é tentar melhorar obras às quais o tempo tornou intocáveis e impossíveis de serem melhoradas. Não tenho curiosidade nenhuma de assistir, por exemplo, ao remake de Oldboy (2003) e com certeza passarei longe da produção que tentará recontar a história de Akira (1987), um dos clássicos da animação japonesa. Porém, em algumas situações, os nomes envolvidos tornam o projeto digno de ao menos uma conferida. Não assisti Conflitos Internos (2002), o longa produzido em Hong Kong que teria dado origem o roteiro de Os Infiltrados (2006) e para ser sincero, quando assisti à esta refilmagem hollywoodiana no cinema, no início de 2007, eu nem tinha ideia de que se tratava de um remake.

Ao menos em Os Infiltrados o peso negativo de ser um remake não desfavoreceu em nada e o segredo pode estar naquilo que já mencionei no parágrafo acima: os nomes envolvidos. De um lado, por detrás das câmeras, temos ninguém menos que Martin Scorsese, que conforme reza a lenda só veio a assistir a versão original depois que seu filme já estava pronto. Não é exagero nenhum afirmar que Scorsese tem no currículo algumas das maiores obras primas do cinema americano na segunda metade do século XX, também não é exagero dizer que ele praticamente reinventou o jeito de fazer filmes de gangster. De outro lado temos um elenco composto por nomes como Leonardo DiCaprio, Matt Damon, Jack Nicholson, Mark Wahlberg, Martin Sheen e Alec Baldwin. Resumindo, são alguns dos mais respeitados atores em atividade sob a batuta de um dos mestres que ajudou a reinventar o cinema hollywoodiano, isto só poderia mesmo resultar em um enorme sucesso de público e de crítica e em uma boa quantidade de prêmios.


Ultra violência, tensão constante e paranoia permeando histórias sobre ganância, debilidade, glória e fracasso, estes têm sido temas recorrentes nos filmes de Scorsese. Os Infiltrados é a perfeita dosagem desta fórmula que transformou o cineasta em uma verdadeira lenda, cada um dos elementos mencionados estão presentes na trama se completando em uma perfeita harmonia, tal como em uma ópera trágica, que expõe seus personagens como peças em um tabuleiro de xadrez, para a partir daí criar uma expressão artística bela e ao mesmo tempo seca e indigesta. Em uma análise mais ampla, pode-se dizer que Os Infiltrados é um filme sobre estratégia, sai na frente quem tem a melhor tática, é assim na realidade violenta dos subúrbios de Boston, que o longa retrata com um realismo contundente. De um lado está a máfia, composta por homens sanguinários, capazes de qualquer coisa para manter o domínio que conquistaram, do lado oposto está a polícia, que tenta equilibrar justiça e corrupção, sendo tão sanguinária quanto aqueles a quem combate.


Na trama, Colin Sullivan (Matt Damon) foi adotado ainda criança por Frank Costello (Jack Nicholson), este um dos chefões da máfia irlandesa em Boston. Frank cuida da família e da educação do garoto com um único propósito, o de que ele se torne um oficial da polícia e passe, depois de então, a atuar como um espião da máfia no departamento. Billy Costigan (Leonardo DiCaprio) se forma na academia de militares no mesmo período que Colin, mas ao contrário deste, tudo indica que ele não terá uma ascensão rápida, nem conquistará facilmente o respeito dos colegas. Os parentes do lado paterno de Billy têm um extenso histórico criminal e ele durante boa parte da adolescência precisou conviver tanto com banda boa, quanto com a ruim de sua família, ele chegava a simular uma personalidade diferente a cada vez que ia passar o fim de semana no subúrbio, na casa do pai. Sua habilidade de transitar em meio a mafiosos e bandidos menores faz de Billy o homem certo para atuar como um infiltrado da polícia no meio dos criminosos, é isto o que lhe é proposto pelo chefe de polícia Oliver Queenan (Martin Sheen) e pelo sarcástico sargento Dignam (Mark Wahlberg).


Para que o plano esteja acima de qualquer suspeitas, Billy é condenado e preso por agressão, depois de algum tempo ele retorna às ruas sem ter mais nenhum vínculo legal com a polícia. Billy usa a fama de seus familiares para conseguir o respeito de Frank Costello e entrar para sua gangue. É então que o jogo realmente começa. O contexto violento do meio empurra os peões em direção ao território inimigo, algumas peças poderão ser sacrificadas, pois por mais que se iludam, elas não passam de simples peões. O cerco começa a se apertar para os dois infiltrados, pois tanto no departamento de polícia, quando entre os bandidos, surge a suspeita de que algum traidor estaria colocando o adversário em posição vantajosa. Ambos não conseguem esconder a angústia que os toma, Colin até tenta dissimular mas está tão temeroso a aturdido quanto Billy. Ambos são tomados por reflexões forçadas acerca de questões relacionadas à ética, à lealdade e à justiça.


Scorsese dá uma verdadeira aula de cinema, mesmo em meio à explosão da violência pode-se perceber a indiscutível qualidade que ele confere à sua narrativa. Algumas sequências do filme parecem já ter nascido clássicas como a cena que se passa em um consultório de psiquiatria e aquela que encerra magistralmente o filme. Montagem e fotografia ajudam a compor o impacto visual que grande parte do filme nos provoca. A trilha sonora potencializa ainda mais o air clássico que o filme aparenta ter, Rolling Stones está presente, o que não é novidade em filmes do diretor. É sublime o forma com que as canções são usadas nas sequências mais violentas, o que nos leva a pensar que estamos diante de um espetáculo artístico e não de atos tão brutais.


O elenco está muito bem, Matt Damon reafirma mais uma vez sua competência para papéis que exigem muito. Jack Nicholson dá o show habitual que dispensa qualquer comentários. DiCaprio, cujo o estilo de atuação continua me lembrando demais o de Marlon Brando (preste atenção em uma cena que acontece no banco traseiro de um carro e me diga que ela não é uma referência a Sindicato de Ladrões), está excelente, a carga dramática que ele confere ao seus personagens é indescritível. Mark Wahlberg (com um penteado que só não consegue ser mais ridículo do que o de Javier Bardem em Onde os Fracos não Têm Vez) foi privilegiado ao ter a oportunidade de viver um ótimo personagem, mas a impressão que fica é a de que era o ator errado, mas isso não prejudica em nada ao filme. O restante do elenco possui atuações menos marcantes mas nem por isso menos louváveis. Os Infiltrados é, na minha opinião, um dos melhores filmes de Martin Scorsese e um dos mais importantes da década. Se você ainda não assistiu, o que está esperando? Ultra recomendado!

Os Infiltrados ganhou os Oscars de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Edição, tendo sido indicado também na categoria de Melhor Ator Coadjuvante (Mark Wahlberg). No Globo de Ouro o filme ganhou o prêmio de Melhor Diretor e foi indicado nas categorias de Melhor Filme de Drama, Melhor Ator de Drama (Leonardo DiCaprio), Melhor Ator Coadjuvante (Jack Nicholson e Mark Wahlberg) e Melhor Roteiro (William Monahan).


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Confiram também aqui no Sublime Irrealidade a crítica de Cabo do Medo,
também dirigido por Martin Scorsese.