N° de acessos:

domingo, 10 de março de 2013

Entre os Muros da Escola

Entre os Muros da Escola (Entre les Murs) - 2008. Dirigido por Laurent Cantet. Escrito por Laurent Cantet, Robin Campillo e François Bégaudeau, baseado no livro de François Bégaudeau. Direção de Fotografia de Pierre Milon. Produzido por Simon Arnal, Caroline Benjo, Barbara Letellier e Carole Scotta. Haut et Court / França.


Entre os Muros da Escola (2008) nos mostra que os desafios enfrentados por profissionais da educação são semelhantes mesmo em um país desenvolvido. Ambientada em uma escola pública de Paris, sua trama acompanha o cotidiano de uma turma da oitava série em um período letivo, focando a relação dos alunos com o professor e os métodos utilizados por este para tentar contornar os inúmeros conflitos que surgem a cada instante. O roteiro adquire um tom quase documental ao retratar a sala de aula sem qualquer tipo de maniqueísmo, em seu desenvolvimento ficam evidentes erros cometidos tanto pela escola, quanto pelo professor e pelos estudantes. Todavia, a intenção do filme não é a de se posicionar como uma crítica ao sistema educacional, o que ele faz é tão somente criar um recorte realista do modelo pedagógico adotado pela escola, que é semelhante ao trabalhado em inúmeras instituições de ensino brasileiras.

A classe que o filme acompanha é uma miscelânea de etnias, estilos e crenças, podendo ser considerada um reflexo da população francesa, composta em boa parte por imigrantes. Neste curioso microcosmo é possível ver estampados o preconceito contra o diferente, a desigualdade social e principalmente a violência, que insurge como uma resposta dos adolescentes às duras realidades em que vivem. À frente desta turma está o professor François Marin (François Bégaudeau), um apaixonado pela arte de educar, sua determinação em fazer com que cada um dos alunos tenha condições de subverter o determinismo de suas vidas é louvável, porém, em dados momentos, o que ele faz parece inútil, uma vez que os resultados de seu esforço não são tão perceptíveis. Mesmo tudo parecendo em vão, ele encontra motivação em pequenas situações, como  na criatividade que um dos alunos mais rebeldes demonstra ter, apesar de sua notável dificuldade de aprendizado. 


Os muros aos quais o título original do longa se refere não são apenas os da escola, como o nome dado a ele no Brasil sugere, das relações entre os personagens é possível pressupor a existência de inúmeros outros muros. É interessante perceber que mesmo o professor, que poderia ser visto à princípio como o herói da história, acaba também sendo vítima das divisórias invisíveis que aparentam manter cada um dos personagens segregado dos demais. A verdade é que nem ele escapa do sentimento xenófobo, que motiva boa parte dos conflitos, sua postura em sala de aula é análoga à uma espécie colonialismo e sua função em dados momentos parece ser a de domesticar, através do idioma francês, aqueles que caminham para a marginalidade (reparem como ele repreende o uso de gírias e outras manifestação étnicas e culturais dos alunos). A trama não condena tal postura, nem o comportamento agressivo de alguns alunos, ela se mantém firme em seu propósito de funcionar apenas como um recorte social, isento de verdades absolutas e incapaz de apontar soluções fáceis para os problemas expostos.


Em uma das passagens, os professores discutem a punição apropriada a ser aplicada em um aluno problemático. François, no entanto, teme as consequências de uma provável expulsão, ele comenta sobre a possibilidade de que o garoto venha a ser obrigado pelo pai a voltar para o seu país de origem (alerta que fora feito por uma outra aluna), diante do exposto alguns educadores parecem declinar de suas posições, ao menos por alguns instantes. Em outro momento, os professores recebem o comunicado de que a mãe de um outro aluno, que estava ilegal na França, fora apanhada pelo departamento de imigração, uma professora propõe que todos participem da audiência na qual o futuro da mulher será decidido, porém, seus colegas ficam calados; o silêncio é quebrado por outra professora que anuncia sua gravidez. Estas duas passagens deixam evidentes o relativo distanciamento afetivo que há entre educadores e alunos, o que obviamente prejudica todo o processo educacional, e ainda a ideia de que uma educação francesa é tudo o que eles precisam e por isso o risco de que algum deles venha a ser obrigado a sair do país é visto com maus olhos.


Boa parte dos atores de Entre os Muros da Escola compõem personagens que são bem próximos daquilo que eles são na realidade, a maior parte dos alunos, por exemplo, levam para suas interpretações suas próprias vivências e isso colabora para que haja um naturalismo em cada uma das atuações, o que torna a trama ainda mais impactante. Não por acaso, quase todos os personagens (incluindo alunos e professores) levam o nome dos atores que os interpretam, dentre os garotos há apenas duas exceções,  Khoumba (Rachel Regulier) e Souleymane (Franck Keïta), que são os mais problemáticos da classe, acredito que fato de ganharem nomes diferentes dos seus se deva à preocupação dos roteiristas de não associar a estes dois atores, as condutas reprováveis de seus personagens.


François Bégaudeau também é educador na realidade e o relato de suas experiência rendera a obra literária, na qual o roteiro foi baseado, isso explica sua excelente desenvoltura na composição do personagem, o que faz com que sua angústia ao se sentir incapaz diante da turma que coordena nos pareça quase palpável em diversos momentos. Todos os adolescentes, sem exceções, também entregam atuações fortes e verossímeis, o que denota também um bom trabalho de direção de atores, uma vez que o fato de interpretarem a si mesmo (ou algo bem próximo disso) não é por si só uma garantia de um bom desempenho. Entre os Muros da Escola possui um ritmo visceral, que faz com sua duração de pouco mais de duas horas passe em um piscar de olhos. A câmera de mão instável e a predominância de sons diegéticos reforçam seu tom documental, que, aliado aos demais aspectos já comentados, o torna uma das obras mais contundentes dos últimos anos.


Entre os Muros da Escola é um filme que deveria ser visto e debatido por todos atores envolvidos no processo educacional, profissionais da área, pais e alunos. Ele é uma daquelas obras que transcendem a grandiosidade de seus méritos cinematográficos, devido à urgência da reflexão que é capaz de proporcionar. Um dos melhores filmes da década passada. Ultra recomendado!!! 


Entre os Muros da Escola recebeu a Palma de Ouro, prêmio máximo do Festival de Cannes!


Assista ao trailer de Entre os Muros da Escola no You Tube, clique AQUI !

A revelação das passagens aqui comentadas não compromete a apreciação da obra, 

16 comentários:

  1. Este filme mostra muito bem os desafios dentro da sala de aula e também um panorama da sociedade francesa. Fica ainda mais realista porque o ator principal já havia sido professor.
    Abraços!

    ResponderExcluir
  2. J. Bruninho, meu querido... minha cunhada e meu concunhado me falaram deste filme. Lembro que ela ficou chocaaaaaaaaada e ele, que já foi professor, super me recomendou. A verdade é que a educação precisa de uma mudança radical! Estamos numa fase caótica...

    bjinhos :*

    JoicySorciere => CLIQUE => Blog Umas e outras...

    ResponderExcluir
  3. É um filme obrigatório para quem trabalha com educação.

    Abraço

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. vai dar uma volta

      Excluir
    2. Excelente filme. Podemos ver a intolerância de todos: Intituiçao, professores e alunos.

      Excluir
  4. Brunão,
    Tudo bem, moço?
    Ainda não vi este filme e como os colegas acima citaram:Obrigatório ver!
    Olha, ando tão assustada com certas atitudes de alguns humanos..Chego a pensar que estamos voltando ao estado animalesco do ser.
    Crianças de 6 anos em escolinhas prendendo o dedo do coleguinha na porta do banheiro até arrancar a ponta do dedinho fora; motoristas embriagados decepando braços de ciclistas e jogando no rio;mãe mordendo e batendo em seu próprio bebê...
    Cara, eu que não assusto com essas coisas estou ficando um pouco boquiaberta com alguns desumanos.

    well, beijo enormeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!

    ResponderExcluir
  5. Sou curiosíssimo para assistir este filme. Estou com ele aqui já tem um tempo, e ainda não o vi, e seu texto só provocou ainda mais a minha curiosidade, uma vez que você o classificou como um dos melhores da década e as questões levantadas na sua crítica acerca do filme são pertinentes e curiosas. Irei conferi-lo em breve. Abraço.

    http://www.leituradecinema.com.br/

    ResponderExcluir
  6. FIlme bom para nos alertar da realidade em que se encontra a educação.Beijão, Sabrina. (www.spiderwebs.com.br) ♥

    ResponderExcluir
  7. Os filmes sobre professores e alunos são quase um gênero a parte no cinema, mas Entre os muros da escola consegue ser diferente e interessante.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Concordo com você Gilberto,esse filme nos mostra o desreipeito uns com os outros.

      Excluir
  8. "Mesmo tudo parecendo em vão, ele [o professor] encontra motivação em pequenas situações".

    Na verdade é bem o que acontece com muitos professores - a maioria? - nas escolas: buscam motivação em progressos muitas vezes esporádicos. Eu, particularmente, acredito no poder das pequenas intervenções em nosso dia a dia. Uma ação que possa parecer pequena agora pode tomar proporções bem maiores do que se imaginava. Não raramente grandes protestos ao longo da história começaram com pequenas intervenções; pessoas conseguiram grandes feitos graças a um conselho ou a uma aula de professor(a).

    Eu assisti a um trecho deste filme em reunião de jornada pedagógica - utilizado justamente para discutir o problema de indisciplina causada por alunos ditos "problemáticos". E é aí que surge a questão do afeto, mas não no sentido "meloso", digamos assim, mas quanto ao olhar, a perceber o outro que está ali querendo chamar a atenção por algum motivo. De fato há um distanciamento, mas isso vem mudando, pois os professores estão tentando contextualizar suas aulas com o que os alunos vivenciam no dia a dia e inclusive com seus problemas mais comuns.

    Boa dica.

    Um abraço!

    ResponderExcluir
  9. Olá, José Bruno.
    Para muitos brasileiros, a Europa pode parecer um paraíso em matéria de emprego, nível de vida e educação, mas creio que filmes como este ajudem a mostrar que todos os lugares do mundo possuem seus problemas, sejam eles grandes ou pequenos.
    Abraço.

    ResponderExcluir
  10. Assisti o filme pra fazer um trabalho de sociologia da educação na faculdade e fiquei apaixonada pela história. Eu tambem vou ser professora então eu espero saber lidar com todas as diferenças que me aparecerem. Realmente esse pra mim é um filme obrigatório e de ritmo maravilhoso

    ResponderExcluir
  11. gostaria de ter esse filme para passa na sala de aula num projeto dia de professor alguém pode me ajudar leo.omega@gmail.com

    ResponderExcluir
  12. Baixar o Filme - Entre os Muros da Escola - Mostra que a escola está isolada e incapaz de resolver os problemas criados pela sociedade - http://mcaf.ee/3me05

    ResponderExcluir
  13. Esse filme e realidade pura..muitas escolas e professores não importam o que o aluno pensa ou faz, infelizmente isso ainda acontece nos dias de hoje. Os educadores tem que valorizar o conhecimento dos seus educandos, aprender aprendendo, respeitá-los e estigá-los a curiosidade para o ensino-aprendizagem. Muita coisa tem que mudar neste país. O filme é ótimo para refletir.

    ResponderExcluir