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domingo, 27 de março de 2011

O Fantástico Sr. Raposo

O Fantástico Sr. Raposo (The Fantastic Mr. Fox) - 2009. Dirigido por Wes Anderson. Roteiro de Wes Anderson & Noah Baumbach, baseado na obra de Roald Dahl. Fotografia de Tristan Oliver. Música de Alexandre Desplat. Produzido por Wes Anderson; Allison Abbate; Jeremy Dawson & Scott Rudin. Twentieth Centuru Fox / EUA.


Cheguei a comentar na resenha que fiz de Os Excêntricos Tenenbaums (2001) sobre o meu pouco interesse em relação à indicação que uma amiga tinha me feito do filme O Fantástico Sr. Raposo (2009). Como deve ter ficado claro pelo artigo que escrevi, o longa de 2001 me despertou a curiosidade sobre a obra do realizador Wes Anderson. Neste fim de semana surgiu a oportunidade de assisti o filme que me tinha sido indicado, ele passaria em um final de tarde em um canal de TV a cabo. Decidi assisti-lo na casa de um amigo (que dormiu a maior parte do filme). Já era evidente que agora eu já tinha uma curiosidade bem maior de assisti-lo, mas ainda tinha medo de que ele me decepcionasse. Mas foi justamente o contrário que aconteceu.

O longa, baseado na obra Raposas e Fazendeiros de Roald Dahl (mesmo autor de Charlie e a Fantástica Fábrica de Chocolates), já nos chama atenção nos primeiros minutos pela qualidade da animação (que propositalmente trabalhou com 12 frames por segundo ao invés dos já tradicionais 24) e pelo belo visual gráfico, que lembra bastante a fotografia em tons de sépia e pastel de Os Excêntricos Tenenbaums. E as semelhanças entre os dois filmes não param por ai, a estranheza característica do diretor também pode ser observada nesta animação que se desvia com êxito dos conceitos já explorados em demasia por outros filmes do gênero. O Fantástico Sr. Raposo não é um filme para fazer rir, ainda que o faça, não é filme sobre consciência ambiental, ainda que funcione como tal. É, na minha opinião, um filme sobre a busca pela identidade com foco nos relacionamentos e dramas familiares, o que mais uma vez nos remete à trama da família Tenenbaum.

A família disfuncional mais uma vez sob o olhar de Wes Anderson
O Sr. Raposo (voz de George Clooney) é um hábil ladrão de galinha, patos e outras aves criadas nas fazendas que ficam na vizinhança de sua toca. Ele decide mudar de vida quando, após uma quase tragédia em uma de suas invasões, sua esposa Felicity (voz de Meryl Streep) o conta que está grávida de seu primeiro filho. O Sr. Raposo promete para ela que nunca mais irá invadir uma fazenda para caçar aves de novo. Ele se torna um mal sucedido jornalista, que escreve uma coluna que ninguém lê, ele não se sente realizado nesta profissão. Três anos (12 anos de raposa) se passaram desde a promessa que o fez mudar de vida, mas as coisas começam a mudar quando ele é seduzido pelo anúncio da venda de uma toca em uma árvore. Ele que não aguentava mais se sentir tão pobre, contraria os conselhos de seu advogado e financia a casa nova, que fica bem perto da propriedade de três dos fazendeiros mais cruéis da região. São eles os impiedosos Boque, Bunco e Bino.


A nova vizinhança irá despertar no Sr. Raposo a sua verdadeira natureza, a de um animal selvagem, guiado apenas pelo instinto natural de sua espécie, de caçar e roubar aves. Num dos diálogos ele questiona: “Como uma raposa pode ser feliz sem ter uma galinha em seus dentes?”. O peso da culpa de ter colocado toda sua família e seus vizinhos em perigo o leva à reflexões existencialistas acerca do real significado da liberdade, que não seria real, uma vez que é dominado não pela razão, mas pelo instinto. “Por que não nasci na forma de outro animal?” Pondera. Paralelo ao drama principal, percebemos também o drama de Ash, o filho do Sr. Raposo, que sente que o pai tem mais admiração pelo sobrinho superdotado, Kristofferson (que está morando temporariamente com eles), do que por ele, que não passa de uma raposinha raquítica. O relacionamento entre pais e filhos é um tema recorrente na obra do diretor e ganha grande proporção na trama deste filme.


Tal como o personagem de Gene Hackman em Os Excentricos Tenenbaums, o Sr. Raposo se vê obrigado a lidar com os problemas que causou e tentar consertar o estrago que provocou em seu seio familiar. Seu estilo blasé, com roupas finas, que contrastam com sua ruína financeira, e a atitude de se achar mais esperto que os outros, o torna quase uma reprodução do cafajeste Royal, que adota modos similares no filme de 2001. Os três fazendeiros deste filme podem ser interpretados como uma personificação das consequências dos atos que o personagem principal comete pelo impulso e, sob um outro olhar, eles ilustram como os seres humanos e animais podem ser confundidos em seu comportamento instintivo. Os outros personagens, como o gambá, que acompanha o Sr. Raposo em seus roubos, e o texugo advogado, também merecem um olhar um pouco mais atento, pois eles são mais que meros coadjuvantes inseridos para compor gags e piadas, eles ajudam bem a ilustrar a adaptação forçada, que comumente sucecede as crises de identidade.


É curioso como a questão da identidade é abordada no filme, os personagens humanos em diversos momentos apresentam comportamentos animalescos, como na cena em que um dos fazendeiros destrói o próprio escritório em um surto de raiva. Em outra sequência, nos deparamos com o Sr. Raposo na mesa de café da manha lendo os classificados no jornal, vestido socialmente com uma camisa branca e gravata listrada, o que lhe confere um ar totalmente humano, de repente ele avança, como animal que é, sobre o café à mesa, destroçando em segundo as panquecas postas à sua frente. Se em Os Excêntricos Tenenbaums Wes Anderson analisa como os indivíduos são determinados por características forjadas por traumas e acontecimentos da infância, neste ele nos induz à reflexão acerca do livre arbítrio e da influência que o instintivo brutalizado e animalesco que possuimos causa em nossas reações aos impulsos internos e externos. 



O Fantástico Sr. Raposo tende a agradar muito mais aos fãs dos esquisitos filmes de Anderson do que aquele que poderia ser seu público alvo, os que curtem as animações com bichinhos legais que pipocam aos montes por ai. É sem dúvidas uma das melhores animações da década, quiçá a melhor em stop motion. Tão importante, essencial e emocionante quanto Ratatouille (2007) , Wall-E (2008) e UP (2009), porém muito mais profundo em suas abordagens. Só não está no topo dos meus favoritos do gênero na década porquê existiu Toy Story 3 (2010) em seu caminho. Indico!

O Fantástico Sr. Raposo foi indicado ao Oscar de Melhor Animação,
prêmio que perdeu para Up - Altas Aventuras. 

Assista ao trailer de O Fantástico Sr. Raposo no You Tube !
.

4 comentários:

  1. eu só indico filme bom

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  2. Adorei essa a análise. Com certeza um filme lindo que faz um choque de realidade. Ainda uma técnica magnífica.Belo de se apreciar!

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  3. Adorei essa a análise. Com certeza um filme lindo que faz um choque de realidade. Ainda uma técnica magnífica.Belo de se apreciar!

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  4. Para mim , é uma obra prima e felizmente a dublagem brasileira não deixou nada a desejar. Agora , em se tratando de animação, Viva, A Vida é Uma Festa quebrou a banca .

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