A Pele que Habito (La Piel que Habito) - 2011. Dirigido por Pedro Almodóvar. Escrito por Pedro Almodóvar e Agustín Almodóvar, baseado na obra de Thierry Jonquet. Direção de Fotografia de José Luis Alcaine. Música Original de Alberto Iglesias. Produzido por Agustín Almodóvar e Esther García. El Deseo S.A., Canal+ España, Instituto de Crédito Oficial (ICO) e Televisión Española (TVE) / Espanha.
Existem alguns cineastas acerca dos quais só criamos boas expectativas, de alguma forma nossa relação com suas obras nos diz que dificilmente eles seriam capazes de nos surpreender negativamente. Este é o meu caso com os filmes de Pedro Almodóvar. Mesmo depois de tantos filmes ele não foi capaz de me decepcionar, reconheço que sua carreira tenha tido altos e baixos, mas no caso dele os “baixos” estão bem acima da média. Foi com este entusiasmo que comecei assistir A Pele que Habito (2011), seu mais recente trabalho. À minha expectativa foi ainda somada uma grande curiosidade, afinal este seria o primeiro flerte do diretor com o terror, gênero que convenhamos não tem muito a ver com estilo melodramático que lhe é característico.
A Pele que Habito, que é uma livre adaptação do livro Tarantula do escritor francês Thierry Jonquet, tem no centro de sua trama o excêntrico doutor Robert Ledgard (Antonio Banderas), um personagem claramente inspirado na clássica figura do cientista louco, ele é um cirurgião plástico que está trabalhando em uma espécie de segunda pele, esta mais resistente que a pele humana natural, a jovem Vera (Elena Anaya) é mantida reclusa em seu laboratório e lhe serve como cobaia em seus experimentos, só quem sabe da existência dela é Marilia (Marisa Paredes), a mulher que criou Robert e que fora trazida por ele para trabalhar como governanta em sua mansão após a morte trágica de sua esposa, a quem ele nunca conseguiu esquecer.
À principio tudo na trama nos leva a crer que ela se desenvolverá como uma história de terror convencional, no início o toque autoral de Almodáver se faz presente apenas na parte estética da obra, que é tão bem trabalhada quanto em seus filmes anteriores. Nesta primeira parte senti que faltava uma pincelada do estilo de caricato e por vezes exagerado do cineasta, algumas peças não encaixavam, tudo indicava que seria um apenas um bom filme e nada a mais que isso. No entanto a trama começa a se desenrolar, outros personagens são somados à ela, segredos começam a ser revelados e o passado dos personagens desnudado, aquilo que parecia estar deslocado, passa a fazer todo o sentido, ainda que da forma mais melodramática e exagerada possível, ai vem a certeza, estamos diante de um filme de Almodóvar!
Em A Pele que Habito o diretor cria uma espécie de metáfora do homossexualismo, um dos temas recorrentes em sua filmografia, no desenvolver da história ele faz uma desconstrução da ideia de estar preso em um corpo não condizente com sua sexualidade, para a partir daí colocar alguns tabus e convenções em xeque, tudo isso é feito de uma forma simbólica e sem panfletarismo, o que torna o filme ainda mais interessante. Não pretendo tecer aqui um comentário mais aprofundado sobre tal metáfora, pois para isso eu teria que revelar segredos da trama, o que tiraria todo o prazer de assistir ao filme... Se por um lado o roteiro expõe de forma quase subliminar suas abordagens, por outro ele já é bem direto, nós expectadores não somos poupados diante de cenas de violência sexual em condições que beiram o grotesco (a foto postada acima dá um claro exemplo disso)...
Em A Pele que Habito Almodóvar volta a trabalhar depois de anos com Antonio Banderas, ator que teve a carreira internacional deslanchada depois da parceria de ambos no excelente Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1987), o último filme no qual tinham trabalhado juntos fora Ata-me, rodado em 1990, há mais de 20 anos portanto. O elenco ainda conta com a presença mais que ilustre de Marisa Paredes, atriz com quem Almodóvar não trabalhava desde Fale Com Ela (2002). Tanto Banderas, quanto Paredes nos presenteiam com ótimas atuações, eles imprimem em seus respectivos personagens uma carga dramática digna dos melhores filmes do diretor espanhol. A bela Elena Anaya também tem um desempenho notável, ela interpreta um dos personagens mais complexos da trama... A fotografia e a direção de arte, são aspectos que praticamente dispensam qualquer comentários, pois já sabemos de antemão que o cuidado com o visual de seus longas é uma das principais marcas de Almodóvar.
A crítica especializada parece ter se descabelado para enquadrar A Pele que Habito em um gênero cinematográfico específico, o filme chegou a ser rotulado de noir (principalmente por causa do livro que lhe deu origem), terror, suspense psicológico, ficção científica e, lógico, melodrama... A verdade é que ele transita por todos estes gêneros sem se ater a nenhum deles. A complexidade de sua trama, que vai se desenvolvendo em camadas, ao mesmo tempo em que é o seu maior charme, também acaba sendo seu ponto mais frágil. A decisão de criar diversos focos narrativos chegou a ser apontada por parte da crítica como a responsável pela “irregularidade” do filme. Eu, no entanto, acredito que se esta irregularidade realmente exista, ela foi proposital e o intuito por trás dela seria tão somente o de gerar a sensação de desconforto que nós espectadores sentimos durante quase todo o filme, sensação esta que explicaria e justificaria a declaração dada pelo diretor de que este seria um "terror, mas sem gritos ou sustos"...
A Pele que Habito não alcança, em minha opinião, o mesmo status qualitativo de obras primas de Almodóvar como Tudo Sobre Minha Mãe (1999), Volver (2006) e Carne Trêmula (1997), no entanto é um grande filme, um dos melhores de 2011, que merece sem dúvidas ser apreciado... Recomendo!
A Pele que Habito recebeu uma indicação ao Globo de Ouro na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, no Bafta ele concorre ao prêmio de Melhor Filme de Língua Não Inglesa
Não permita que este trailer (horrível) lhe desmotive!
J. Bruno, tudo bem?
ResponderExcluirUm filme que estou com muito interesse em assistir. Gosto de muitas atuações do Antonio Banderas (fica devendo em algumas), mas suas parcerias com Almodovar sempre foram maravilhosas, casamento perfeito.
Pelo que entendi é um filme de suspense.
Gostei muito da tua resenha, o que o tornou ainda mais interessante, estou muuuuito curiosa com este filme e fiquei mais!
Grande abraço!
Valeu teu texto!
Eu não sou um grande admirador de Antonio Bandeiras, le é sim um bom ator, mas penso que ele não soube se valorizar pelo seu talento e se deixou ser durante muito reduzido a um estereótipo de galã latino... Concordo que a parceria entre eles tenha rendido obras maravilhosas e esta é uma delas, apesar de ser um filme mediano pelo padrão padrão de Almodóvar...
ExcluirO suspense é sim uma das vertentes do filme, mas ele tem várias, o que o torna ainda mais interessante... Assista sim eu lhe recomendo!
Abração Cissa!
Ah! Marisa Paredes?... simplesmente uma das melhores atrizes que já vi! maravilhosa!
ResponderExcluirEla é ótima!
Excluirbruno,
ResponderExcluiralmodovar não é cinema; é o próprio cinema.
abraço!
Concordo Jorge, ele é um dos cineastas mais originais e criativos de nosso tempo!
ExcluirEstou louco para ver essa obra, agora, muito mais. Muito boa a resenha, prova de sua capacidade de observação, crítica e boa escrita.
ResponderExcluirParabéns!
Obrigado Dilso! Assista sim acredito que o filme te impactará do mesmo jeito que me impactou!
ExcluirBruno,
ResponderExcluirCritica ao estilo de Pedro Almodóvar. Tive uma mistura de sentimentos com o filme, medo, raiva, pena e melancolia.
Depois de um tempo, senti a solidão e a loucura do cirurgião como essenciais a trama.
Belo espetáculo de horror, drama, amor, violência ou mistura de tudo.
Beijos.
Lu
Luciana, confesso que não tinha analisado a trama por esta angulação, a da solidão do personagem do Banderas... curioso como ele tenta aplacar a dor da morte da esposa, não só com o "experimento", mas também levando a governanta e outros empregados para sua mansão, isto, sem contar o restante, mostra o quão solitário ele se sentia...
ExcluirNossa!! Parece ser um excelente filme, eu já tinha dado uma olhada, mais não me chamou a atenção, mais depois do seu post, nossa fiquei mega curiosa e com vontade de assistir!! Otima postagem... Bjs
ResponderExcluirhttp://www.artesdosanjos.com.br/
Assista sim, ele é forte, intrigante e belo, o tipo de filme que vale a pena assistir!
ExcluirBah meu, acertou em cheio nesse filme!! Eu não vi ainda, sei que a crítica foi muito positiva e esse apanhado que você dá sobre a obra, bah, tentação total. Verei ele hoje.
ResponderExcluirVou pra casa da patroa e não sabia um filme pra ver. Mandou benzão na recomendação.
Depois volto aqui e deixo minha opinião relativo a ele.
Valeuu!
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Site Oficial: JimCarbonera.com
Rascunhos: PalavraVadia.blogspot.com
Volte sim Jim, você é sempre bem vindo meu caro!
ExcluirEspero que a patroa goste, se ela ficar "assustada" não me culpa rsrsrsr
Forte abraço!
Bruno, eu sou do grupo dos que gostaram (muito) do filme. Curiosamente, embora ele não tenha saído da minha cabeça por dias, não tentei fechar nenhuma interpretação sua. Acho que a ideia da metáfora do homossexualismo é bem pertinente. Mas estamos falando de Almodóvar,um cineasta superior e não um fazedor de panfletos, como você bem notou. Se a questão da sexualidade encaminha o enredo, o filme felizmente não se restringe a ela. Aparecem nele amadurecidas questões como o lugar onde se situa a identidade dos sujeitos; e a sede megalomaníaca de conhecimento, atrelada a uma medicina que parece tanto mais assustadora quando mais ela é tratada de modo sutil e realista e, portanto, próximo de nós. Gostei de Bandeiras, que há 15 anos eu via como um canastrão de marca maior; e da Elena (minha orientadora me lembrou que ela faz uma das moças em coma do - maravilhoso - "Fale com Ela").
ResponderExcluirMuito bom você ter trazido esse filme pra cá!
Bjs
Dani
Seja super bem vinda Danielle!!!
ExcluirAdoro seus comentários, concordo com o que você, os aspectos que você citou estão presentes e explícitos em todo o filme, no entanto a metáfora que citei me intrigou, achei interessante a forma com que o roteiro inverte a condição homossexual para desconstruí-la, nem sei se posso tomar este como um argumento válido acerca da questão, mas ele foi mostrado de um forma forte e poética...
Banderas também já não me convencia há um tempo, citei em um dos comentários acima que ele parece não ter se valorizado, mesmo sendo talentoso, ele se vendeu em troca da frágil imagem de galã latino, que dada a idade dele, já deve estar perto de ser desfeita...
Preciso baixar e ver, ai comento contigo, com mais contexto. Abraço
ResponderExcluirLhe aguardo Victor!
ExcluirVelho assisti ele hoje, e fiquei incrivelmente pasmo ante a tal metafóra de homossexualismo. Essa espectativa que ele faz, ao colocar o tempo do filme em 3 partes, foi feliz do meu ponto de vista. Não sei se encaixo ele na categoria "Noir" mas que lembra bastante, lembra sim. Almodovar para mim é gênio, e quase nenhum filme supera "carne tremula" para mim. Feliz aniversário, e obrigado por todo o apoio de sempre lá na blogosfera. Abraço
ExcluirObrigado a você Victor, aquele grupo não existiria se não fosse por ti e valeu por ter se lembrado do meu aniversário!
ExcluirEste sentimento de perplexidade foi experimentado por mim e por quase todos meus amigos que o assistiram, Almodóvar é sim um cineasta genial!
Olá Bruno! :)
ResponderExcluirDesculpa por não ter retribuído sua visita antes :/, mas obrigada pela visita mesmo!
Ouvi muito falar desse filme, as críticas...Mas ainda não assisti. Vou seguir o exemplo do Victor: assistir ao filme e "voltar aqui para comentar com você, com mais contexto".
Abraços!
Ah, não se preocupe Caroline... Quando assisti-lo volte sim, você sempre será bem vinda!
ExcluirAbração!
Oi J. Bruno!
ResponderExcluirOlha eu sempre me interessei pelas obras de Almódovar..ela é ousado do tipo que Stanley Kubrick foi, mas claro de forma diferente e distinta.
Com sua resenha fiquei muito curiosa em ver o filme. Sou fã do suspense e do terror psicológico que é muito mais perturbador do que qualquer outro gênero.
Afinal, não há nada mais desesperador do que a própria mente humana.
Ah eu não acho o cosplay da Faye tão fácil assim..na verdade o dificil não é nem a roupa e sim a coragem de andar num evento com algo tão ousado. Eu por exemplo não usaria esse cosplay kkkkk. Prefiro roupas justas e que modelem o corpo, como o macacão sexy da Júlia, personagem do mesmo anime que eu já fiz cosplay.
Sim, Cowboy Bebop tem muitas referencias...se você quiser, dá uma lida no artigo que fiz sobre a obra:
bjs
Passarei lá para conferir Tsu!
ExcluirLhe recomendo o filme, não deixe de assisti-lo, como mencionei, é um filme forte, contundente e belo ao mesmo tempo, tal como sempre esperamos de um filme de Almodóvar...
Estou muito a fim de ver este filme mas ainda não consegui.Depois de ler o teu texto vou ter de dar um jeito de assisti-lo imediatamente.Que bom conhecer mais um apreciador de cinema.Grande abraço.
ResponderExcluirSeja bem vinda Suzana, é um prazer lhe conhecer também!
ExcluirNão deixe de assisti-lo, volte aqui depois para comentar!
Abraços!
Está aí um filme que ainda não consegui ver, por falta de tempo... por incrível que pareça! Sacomé, né? Ele estava na listinha das férias, mas, mesmo sem estar trabalhando, a correria foi grande... Ouvi falar super bem e está na nova lista! Estou com planos de assisti-lo final de semana que vem...
ResponderExcluirAssim que assistir, virei correndo falar o que pensei!
bjks JoicySorciere => Blog Umas e outras...
Ele já estava na minha listinha também a um tempão Joicy e só agora consegui assistir, minhas férias já se aproximam do fim e até agora não consegui assistir nem metade do que eu tinha me proposto... Mas não deixe de assisti-lo e volte aqui depois para comentar! Beijão!
ExcluirEu sempre disse e repito, Almodovar é, para mim, o grande entendedor da alma feminina. Seja das que nasceram mulheres, ou as que "se tornaram" mulheres(mas, que acreditam terem nascido com essa alma, que é o caso de todas as travestis de suas histórias). No caso de A pele que habito, há uma queeeeebra desse paradigma(que pra mim foi uma espécie de desequilíbrio total). Quem assistiu o filme vai entender o que eu quero dizer com isso. Concorda???? Caramba, esse filme mexeu muito comigo... MUITO!!! Como vc sabe, acabei de assistir e como o amigo Celo [quase] me proibiu de ler qualquer resenha sobre o filme, só agora estou curiando de verdade seu texto. Grande beijo
ResponderExcluirJoicy, foi a mesma reação que tive ao final do filme, a reflexão proposta é ótima e eu também o vejo como uma quebra de paradigma em relação aos outros filmes do diretor que o antecederam...
ExcluirDepois dos seus comentários lá no face, deu até vontade de revê-lo rsrsrrs
Beijão!!
Realmente comecei a imaginar como se sente um travesti...meu deus, esse filme foi foda !
ExcluirAgora e sou "obrigada" a assistir esse filme, eu sou fã do Antonio Banderas, e curiosidade é uma fraqueza minha. Bjos.
ResponderExcluirÉ obrigada mesmo Luciana e nós lhe cobraremos isso! kkkk
ExcluirO impacto que o filme causa é surpreendente! Assista!!!!