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sábado, 13 de outubro de 2012

A Troca

A Troca (Changeling) - 2008. Dirigido por Clint Eastwood. Escrito por J. Michael Straczynski. Direção de Fotografia de Tom Stern.  Música Original deClint Eastwood. Produzido por Clint Eastwood, Brian Grazer, Ron Howard e Robert Lorenz. Imagine Entertainment, Malpaso Productions e Relativity Media / USA.


A primeira reação que tive quando comecei a assistir A Troca (2008) foi a de negação, eu não conseguia aceitar que a história contada por ele tinha sido baseada em acontecimentos verídicos, tamanho o seu absurdo. A simples probabilidade de algo parecido acontecer já é capaz de nos assustar e de nos fazer refletir acerca da fragilidade e da incompetência do Estado em garantir aos indivíduos direitos básicos e inalienáveis e ainda sobre até que ponto iria nossa força se fossemos postos em uma situação parecida com a que a personagem central vive no filme. Ainda que os fatos narrados tenham sido dramatizados, personagens criados e situações alteradas, como frequentemente acontece, o peso da trama continua o mesmo, isto porque o que nos deixa perplexos nela não são os seus pequenos detalhes, mas a sua base, aquilo que estamos convencidos de que é de fato real. 

O filme se passa em Los Angeles nos anos 20 e conta a história de Christine Collins (Angelina Jolie), uma mãe solteira que trabalha em uma companhia de telefonia e se desdobra entre o emprego e os afazeres domésticos para cuidar de seu filho de nove anos. Em seu primeiro ato, que dura relativamente pouco, o longa busca retratar o relacionamento entre ela e o filho, Walter (Gattlin Griffith), um relação afetada pela ausência do pai, que desaparecera antes do nascimento do menino, e pelo relativo distanciamento dela, devido à falta de tempo. O filme deixa claro que ela ama o garoto e que justamente por isso se submete à uma jornada de trabalho tão pesada... Esta contextualização, que o filme faz em suas primeiras sequências, é muito importante, pois é ela nos ajudará a compreender a dor e a culpa que a personagem sentirá nos atos seguintes.


No dia 10 de março de 1928, um sábado, Christine foi chamada para resolver um problema no trabalho, mesmo relutante ela quebra a promessa que tinha feito a Walter, de levá-lo para passear, e vai para o serviço, deixando-o sozinho em casa. No final do expediente, após deixar o posto de trabalho, ela é abordada pelo seu chefe, que a elogia. Estes segundos de diálogo a fazem perder o bonde que a levaria de volta. Por causa do contratempo ela chega em casa já no início da noite. Ao entrar ela se surpreende com a ausência do filho, o lanche que deixara pela manhã ainda estava intocado e não havia sinal nenhum sinal do menino, ela o procura nas redondezas, indagando aos vizinhos, mas ninguém tem nenhuma informação para lhe dar. Naquele mesmo dia ela liga para o Departamento de Polícia da cidade, mas o atendente lhe informa que eles só procuram por pessoas que estão desaparecidas há mais de 24 horas e que provavelmente Walter voltaria pela manha. 


Na manha seguinte o garoto não aparece. Passadas as 24 horas a polícia finalmente vai até a casa de Christine e abre uma ocorrência. À medida que os dias passam a angústia dela aumenta, mas ela se mantém firme e enfrenta tudo com uma força surpreendente. Cinco meses depois do desaparecimento, a polícia entra em contato com ela e a avisa que Walter fora encontrado em uma outra cidade. A resolução do caso ganha a mídia e se torna uma propaganda positiva para o Departamento de Polícia, que estava com a imagem maculada devido ao envolvimento em diversos casos de corrupção. No entanto, há um pequeno problema, que é logo percebido por Christine, o garoto encontrado definitivamente não é o Walter. Os policiais, contudo, não aceitam que erraram, eles temem perder a publicidade proporcionada pela resolução do caso e ainda ter que enfrentar um novo escândalo.


J. J. Jones (Jeffrey Donovan), chefe da divisão de menores da polícia de Los Angeles, está disposto a tudo para encobrir a verdade, ele usa diversas artimanhas para convencer Christine de que aquele que lhe foi entregue é de fato seu rebento. Ele justifica que ela está incapaz de fazer julgamentos devido ao choque provocado por toda aquela situação; que toda criança sofre grandes transformações em um período de cinco meses e ainda que o próprio menino estava traumatizado pelo tempo que passara longe de casa o que explicava sua confusão e perda de memória. Christine continua sem aceitar que aquele é seu filho, mas mesmo assim ela o acolhe em sua casa, sem, porém, desistir de convencer a polícia do erro cometido, o que permitiria que as buscas pelo seu filho verdadeiro fossem retomadas. A partir deste ponto da trama o que se segue é uma odisseia kafikiana em busca de justiça e da verdade. Uma caminhada que levará a descobertas ainda mais assustadoras...


Ao refletir de uma forma um pouco mais aprofundada sobre a história contada, percebo que, apesar de absurda, ela é plausivelmente real e que há em torno dela todo um contexto que favoreceu tamanho equívoco e a insistência nele por partes das autoridades. Christine era uma mãe solteira, uma proletária, ou seja, ela não tinha voz nem tão pouco credibilidade diante da sociedade da época. Sua própria condição a tornara um alvo fácil para as artimanhas de J. J. Jones. Ao analisar o caso sob uma perspectiva um pouco mais ampliada, nos deparamos com a sociedade na qual os personagens estavam inseridos, uma sociedade dominada por criminosos e corruptos, que se associam e exercem influência através da imposição da força. O Departamento de Polícia surge neste contexto como o braço armado de todo este esquema e sendo assim, se a incompetência dele fosse revelada todo o sistema seria abalado. Com tantos interesses em jogo, se torna ao menos um pouco mais compreensível o fato de tamanha inverdade ser encoberta e ignorada por tanto tempo.


É interessante perceber que, mesmo ao adotar uma postura abertamente crítica, o filme ainda reflete o posicionamento político de Clint Eastwood, que é um conservador de direita. De certa forma a trama imputa a responsabilidade pelos fatos aos indivíduos e não ao sistema como um todo. O cineasta acredita neste sistema e não por acaso o último ato do filme (que muitos consideram dispensável) é praticamente dedicado a ele. O personagem Briegleb (John Malkovich) é o mais próximo que se tem de um alter-ego do diretor na história, ele é um pastor presbiteriano (uma figura claramente conservadora) que se dedica a expor e denunciar a corrupção que impera na cidade, é ele quem conduz a personagem central aos meios legais para conseguir aquilo que busca, é ele que a mostra que o sistema pode funcionar a seu favor. Como contraponto a Briegleb, há no filme uma outra personagem, uma prostituta (esta, uma figura subversiva), que em dado momento tenta fazer justiça com as próprias mãos e paga o preço por isso.


A Troca explora o drama da história narrada de uma forma sutil e sem exageros melodramáticos. Desta forma ele escapa do risco de tropeçar em diversos clichês, como viria acontecer em Além da Vida (2010), o filme seguinte de Eastwood. A narrativa emociona, mas sem precisar ser apelativa para tanto e o desempenho da Angelina Jolie colabora muito para isso, ela consegue expressar tanto a fraqueza quanto a força de sua personagem de uma forma convincente e realista, ela está ótima, ouso afirmar que esta é sua melhor atuação até então, superior até mesmo à de Garota Interrompida (1999). O filme ainda se destaca pela excelente fotografia, pela direção de arte, que faz uma ótima reconstrução de época, e pela trilha sonora, composta pelo próprio Clint Eastwood. É, sem dúvidas, um filme que merece ser conferido por todos. Recomendo! 


A Troca foi indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Atriz (Angelina Joilie), Fotografia e Direção de Arte. No Globo de Ouro o filme recebeu indicações nas categorias de Melhor Atriz em um Filme de Drama e Melhor Canção Original.

Assistam ao trailer de A Troca no You Tube
clique AQUI !

A revelação das passagens aqui comentadas não compromete a apreciação da obra,

Confiram também, aqui no Sublime Irrealidade, as resenhas críticas de
Os Imperdoáveis e Além da Vida, também dirigidos por Clint Eastwood
(clique no link) !

14 comentários:

  1. Um texto bem esclarecido. Sem dúvidas, A Troca tem muito das aspirações pessoais de Eastwood. Gosto do filme e da atuação da Jolie, mas não é meu favorito do diretor. Ah... pode me criticar...hehe...gosto mais de Além da Vida do que esse.

    Abração.

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    1. Eu já imaginava isso Celo, lembro de você ter incluído o "Além da Vida" na lista dos melhores que você assistiu no ano passado...

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  2. Apesar de se alongar mais do que deveria, é mais uma bela realização de Eastwood, um drama sensível e ao mesmo tempo intimista.

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  3. Assisti A Troca há alguns anos - um dois, eu acho. Adorei o filme. Quando ele terminou fui correndo na internet pesquisar sobre Christine Collins. Gostei muito da história, mesmo. O figurino do filme, nem se fala: perfeito e sofisticado. Realmente uma bela película.
    Abraços.

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  4. Apesar de já ter passado diversos vezes na tv por assinatura, ainda não conferi este trabalho de Clint.

    Abraço

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  5. É um bom filme. Só a Angelina é que não me convence.

    O Falcão Maltês

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  6. filme emq eu a angelina tem otima atuação mas
    o resto nao convence ao contrario da opiniao do cara acima

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  7. Eu adorei este filme, a Jolie estava realmente perfeita no papel, foi feito pra ela. É um filme intenso, envolvente, é um Clinit Eastwood.
    Foi marcante a cena em que ela desmaia (tentando não dar spoiler, ok) haha
    =)

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  8. Olá!Bom dia!
    Bruno!
    Tudo bem por aqui?
    Gostei do filme... não sabia bem de alguns detalhes,sua crítica/ argumentos foram bem esclarecedoras. Talvez vendo o filme novamente teria uma nova impressão. Gostei da qualidade técnica da produção, figurinos impecáveis, e, sobretudo, a excelente performance da Angelina Jolie. Não gostei muito da "fotografia" ( muitas "sombras" em cima dos policiais corruptos, risos), e minha admiração por mulheres como Cristine, ou muitas outras em tempos e lugares diferentes, que tiveram que desafiar e questionar um sistema masculino opressor...
    Obrigado!
    Bom domingo!
    Abraços

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  9. Depois daqui, saí disposta a assisti-lo!
    Muito bom seu post e abordagem sobre o filme, parabéns!

    Beijos.

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  10. Gostei muito do filme. E não o vejo fora da realidade. Ainda hoje, corporações fazem de tudo para se manterem, para se promoverem, mesmo que calcadas em conhecidas falhas e injustiças. Bjs.

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  11. Olá, José Bruno.
    Vi esse excelente filme algum tempo atrás e concordo com sua análise, é de assustar realmente a atitude dos policiais de tentarem convencer Christine de que ela estava errada e não admitirem seu erro de forma alguma.
    Clint Eastwood é um de meus atores/diretores preferidos, já que consegue passar emoção sem apelar para dramatização excessiva e melodramática.
    Agradeço por teres compartilhado meu texto.
    Abraço.

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  12. J. Bruno, assisti esse filme há alguns meses. Achei belíssimo e muito triste. Pensar que realmente aconteceu, é de assustar. Logo que terminei de assistir fui pesquisar no papai 'Gúgol' à respeito dessa terrível história. Não há muitos relatos sobre ela(pelo menos eu não consegui encontrar muitas), mas as poucas que achei aproximaram-se bastante do que mostra o filme. Eu gosto muito do Clint. Ele, sem sombra de dúvidas, é grande diretor e ator.

    bjks JoicySorciere => CLIQUE => Blog Umas e outras...

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