Sindicato de Ladrões (On the Waterfront) - 1954. Dirigido por Elia Kazan. Roteiro de Malcolm Johnson & Budd Schullberg, baseado na série de artigos de Malcolm Jonson. Fotografia de Boris Kaufman. Música de Leonard Bernstein. Produzido por Sam Spiegel. Columbia; Horizon / EUA.
O início da Guerra Fria foi marcado nos Estados Unidos principalmente pelo temor e apreensão que a “ameaça” comunista representava para as instituições americanas. Neste contexto de instabilidade política, teve início uma ação liderada pelo senador Joseph McCarthy, que consistia na espionagem e vigilância de indivíduos que fossem suspeitos de pregar ou se simpatizarem com a ideologia Marxista. Com isso milhares de pessoas tiveram suas vidas expostas e reviradas por espiões do governo, muitos perderam seus empregos, foram presos, desapareceram misteriosamente ou foram levados ao suicídio pelos traumas das investigações. O Marcatismo estenderia sua vigilância também ao campo da cultura e da arte, numa ação que ficaria conhecida como “caça às bruxas”. Charlie Charplin, Luiz Buñuel e Bertold Brecht (os dois últimos moravam nos EUA na ocasião) foram alguns que estiveram na mira do cerco promovido pelo estado.
O início da Guerra Fria foi marcado nos Estados Unidos principalmente pelo temor e apreensão que a “ameaça” comunista representava para as instituições americanas. Neste contexto de instabilidade política, teve início uma ação liderada pelo senador Joseph McCarthy, que consistia na espionagem e vigilância de indivíduos que fossem suspeitos de pregar ou se simpatizarem com a ideologia Marxista. Com isso milhares de pessoas tiveram suas vidas expostas e reviradas por espiões do governo, muitos perderam seus empregos, foram presos, desapareceram misteriosamente ou foram levados ao suicídio pelos traumas das investigações. O Marcatismo estenderia sua vigilância também ao campo da cultura e da arte, numa ação que ficaria conhecida como “caça às bruxas”. Charlie Charplin, Luiz Buñuel e Bertold Brecht (os dois últimos moravam nos EUA na ocasião) foram alguns que estiveram na mira do cerco promovido pelo estado.
Como Hollywoody não era povoada apenas por bons mocinhos tiveram ainda aqueles que se encarregaram de colaborar com as listas negras que eram divulgadas pelos marcatistas e renovadas a cada ano. Dentre os delatores estavam John Wayne (que se orgulhava de ter colaborado), Edward Dmytryk (que passou de perseguido a acusador) e Elia Kazan, este último também nunca se desculpou por ter entregado 11 colegas para o Comitê de Atividades Anti-Americanas e ficaria marcado para sempre por esta atitude mesquinha. Em 1999 Kazan ganhou o Oscar Honorário da Academia, a premiação gerou polêmica e alguns artistas, dentre eles Abraham Polonski (diretor que também foi perseguido), incentivaram um protesto planejado para o dia da festa de entrega do Oscar, pedia-se que os convidados não aplaudissem o cineasta maculado por seu passado. Na cerimônia alguns o aplaudiram, muitos não e outros tantos ainda o vaiaram.
O mais perto que Elia Kazan chegou de um pedido de desculpas foi com o filme Sindicato de Ladrões (1954). Ainda há controvérsias sobre tal interpretação que alguns críticos fazem do longa, uma vez que o seu roteiro começou a ser escrito por Arthur Miller bem antes dos depoimentos do diretor. O dramaturgo abandonaria o projeto quando veio a tona a notícia das delações feitas por Kazan. Budd Schulberg foi quem assumiu o roteiro da obra, que se tornaria clássica e, ironicamente, um contundente convite à organização descentralizada e ao levante do proletariado. O diretor, ao que parece, levou para o filme todo seu questionamento ético, que se expressa nas contradições e na angústia reflexiva do personagem principal, que se atormenta com o dilema de delatar ou não o esquema formado por aqueles que ele acredita serem seus amigos.
“Sabem o que há de errado aqui? É o amor pelo dinheiro fácil, que é mais importante que o amor ao próximo”.
No longa, Marlon Brando, numa atuação brilhante, interpreta Terry Malloy, um boxeador fracassado, que trabalha de estivador no porto e colabora com os negócios obscuros do chefe do sindicato dos portuários, Johnny “Camarada” (Lee J. Cobb). Terry participa involuntariamente do assassinato de um estivador, que tinha tentado denunciar o lucrativo esquema que domina o porto. O jovem passa a ser atormentado por sua consciência, à medida que passa ter a compreensão do quão sujos são os negócios de seu sindicato, nos quais também está indiretamente metido. Edie Doyle (Eva Marie Saint), irmã do homem que fora morto, não se conforma com a perda do irmão e acaba por convencer o padre local (Karl Malden) a sair de sua inércia e organizar um movimento para unir os trabalhadores em prol de melhores condições de trabalho e contra os mandos e desmandos do sindicato corrompido. As represálias se intensificam no intuito de manter os portuários silenciados.
“Consciência, isso pode deixar a gente louco”
A relação que começa a se desenvolver entre Terry e Edie, depois que eles se conhecem, intensifica o dilema que ele está vivendo. Se por um lado ele reconhece as injustiças que vigoram no lugar, por outro ele teme ter que prejudicar o “trabalho” lucrativo de seus amigos e de seu irmão mais velho, Charley (Rod Steiger), braço direito de Johnny “Camarada”, que foi seu único amparo enquanto vivia em um orfanato na infância. O embate ético no qual o personagem se mergulha não é simples, uma vez que a moral que vigora naquele local é instável e totalmente deturpada, a noção de certo e errado parece estar às avessas. A sua falta de expectativas com relação à própria vida o torna ainda mais inseguro e temeroso quanto a decisão de se levantar contra os poderosos que detêm o controle de tudo que acontece no porto. Numa das cenas ele deixa bem claro para a idealista Edie, que seu único objetivo é sobreviver, o que por si só já seria uma tarefa árdua, levando-se em conta suas condições de vida.
Durante o filme, algo me chamou a atenção, o quanto a atuação de Marlon Brando, construída sobre os preceitos do método de Stanislavsky (que Lee Strasberg adaptou para o cinema), me faz lembrar o estilo adotado por Leonardo Di Caprio (que com certeza deve tê-lo como inspiração) nos dias de hoje. Após este ligeiro devaneio, ainda assistindo ao filme, comecei a traçar um paralelo entre Sindicato de Ladrões e Diamante de Sangue (2007), que tem uma das melhores atuações de Di Caprio, na minha opinião. Ambos têm como personagens principais homens que foram embrutecidos pela vida árdua e pelo contexto em que estão inseridos, em ambos o dilema ético é impulsionado pela presença de uma mulher idealista, que leva o protagonista a rever seus pontos de vistas e tomar a atitude que o levaria a redenção. Apesar da diferença de quase 50 anos entre os dois longas, a similaridade é impressionante e a tônica da luta pela justiça social, que impulsiona as duas tramas, tem o poder de nos levar à reflexão, sem que seja purgado em nós o anseio pela transformação, tal anseio é alimentado pelas histórias, que nos convidam a repensar nosso próprio comodismo.
Sindicato de Ladrões é impressionante, principalmente, pelas atuações estupendas de Marlon, Eva, Karl e de todo o elenco secundário, que dão o brilhantismo, o suporte emocional e a dramaticidade necessária para que cada sequência do filme seja em si, ao mesmo, tempo natural, instigante e detentora da indescritível capacidade de nos oferecer algo que vai muito além do entretenimento característico de Hollywood. O filme também é de um realismo social chocante e isto se expressa nos figurinos e nos cenários por onde os personagens transitam. A decisão audaciosa de levar os sets de gravação para as ruas e para o porto de Nova Iorque em um inverno gelado foi acertada e contou muito para o resultado final. A fotografia também é muito bem trabalhada, preste atenção na forma com que a luminosidade é trabalhada na icônica cena do diálogo entre Terry e seu irmão, que se passa no banco traseiro de um táxi.
A cena em que o personagem de Marlon caminha pelo cais após ter sido brutalmente espancado é emblemática e de um poder sobrenatural, que conseguiu ultrapassar até mesmo o contexto histórico conturbado que a deu o sentido original. No caso deste filme, vale a premissa, defendida por Oscar Wild através de seu alter ego em O Retrato de Dorian Gray, a de que o que deve ser exposto é a obra e não o artista. Se Kazan foi ou não um crápula de um delator não interessa, o que importa é que Sindicato dos Ladrões é uma produção que transcende a biografia de seu diretor e que viria se tornar um dos maiores clássicos do cinema americano. É uma obra que de forma nenhuma deve ser renegada por quem se diz amante da sétima arte!
Durante o filme, algo me chamou a atenção, o quanto a atuação de Marlon Brando, construída sobre os preceitos do método de Stanislavsky (que Lee Strasberg adaptou para o cinema), me faz lembrar o estilo adotado por Leonardo Di Caprio (que com certeza deve tê-lo como inspiração) nos dias de hoje. Após este ligeiro devaneio, ainda assistindo ao filme, comecei a traçar um paralelo entre Sindicato de Ladrões e Diamante de Sangue (2007), que tem uma das melhores atuações de Di Caprio, na minha opinião. Ambos têm como personagens principais homens que foram embrutecidos pela vida árdua e pelo contexto em que estão inseridos, em ambos o dilema ético é impulsionado pela presença de uma mulher idealista, que leva o protagonista a rever seus pontos de vistas e tomar a atitude que o levaria a redenção. Apesar da diferença de quase 50 anos entre os dois longas, a similaridade é impressionante e a tônica da luta pela justiça social, que impulsiona as duas tramas, tem o poder de nos levar à reflexão, sem que seja purgado em nós o anseio pela transformação, tal anseio é alimentado pelas histórias, que nos convidam a repensar nosso próprio comodismo.
Sindicato de Ladrões é impressionante, principalmente, pelas atuações estupendas de Marlon, Eva, Karl e de todo o elenco secundário, que dão o brilhantismo, o suporte emocional e a dramaticidade necessária para que cada sequência do filme seja em si, ao mesmo, tempo natural, instigante e detentora da indescritível capacidade de nos oferecer algo que vai muito além do entretenimento característico de Hollywood. O filme também é de um realismo social chocante e isto se expressa nos figurinos e nos cenários por onde os personagens transitam. A decisão audaciosa de levar os sets de gravação para as ruas e para o porto de Nova Iorque em um inverno gelado foi acertada e contou muito para o resultado final. A fotografia também é muito bem trabalhada, preste atenção na forma com que a luminosidade é trabalhada na icônica cena do diálogo entre Terry e seu irmão, que se passa no banco traseiro de um táxi.
A cena em que o personagem de Marlon caminha pelo cais após ter sido brutalmente espancado é emblemática e de um poder sobrenatural, que conseguiu ultrapassar até mesmo o contexto histórico conturbado que a deu o sentido original. No caso deste filme, vale a premissa, defendida por Oscar Wild através de seu alter ego em O Retrato de Dorian Gray, a de que o que deve ser exposto é a obra e não o artista. Se Kazan foi ou não um crápula de um delator não interessa, o que importa é que Sindicato dos Ladrões é uma produção que transcende a biografia de seu diretor e que viria se tornar um dos maiores clássicos do cinema americano. É uma obra que de forma nenhuma deve ser renegada por quem se diz amante da sétima arte!
Sindicato de Ladrões ganhou o Oscar nas categorias de Melhor Filme, Diretor, Roteiro, Ator (Marlon Brando), Atriz Coadjuvante (Eva Marie Saint), Direção de Arte, Fotografia e Edição. O longa ainda foi indicado ao prêmio de Melhor Trilha Sonora e teve outras 3 indicações para a categoria de Ator Coadjuvante (LeeJ. Cobb; Karl Malden e Rod Steiger).
Assista ao trailer de Sindicato de Ladrões no You Tube ! (clique no link)
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