A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no kamikakushi; 千と千尋の神隠し) - 2001. Escrito e Dirigido por Hayao Miyazaki. Direção de Fotografia de Atsushi Okui. Música Original de Joe Hisaishi. Produzido por Toshio Suzuki. Studio Ghibli, NTV, Dentsu, Mitsubishi, Tokuma Shoten, Touhoku Shinsha e Walt Disney Pictures / Japão | EUA.
A Teoria do Autor concebida por François Truffaut, Jean-Luc Godard e outros críticos da revista Cahiers du Cinéma fazia a apologia de um cinema mais conceitual, onde a figura do diretor viesse a substituir a do produtor como o principal responsável pela obra. Nesta concepção o filme alcançaria o status de obra de arte, superando a condição inicial de um mero produto industrializado. Através da observação analítica da obra de alguns cineastas como Hitchcock e Howard Hawks, Godard e Truffaut identificaram traços comuns que se repetiam nos filmes, advindos da inevitável influência da personalidade de seus realizadores. Em Hitchcock, por exemplo, eles observaram temas recorrentes como o repúdio á autoridade e a obsessão pela culpabilidade, aspectos estes que funcionavam como uma assinatura nos longas do mestre do suspense.
O cineasta japonês Hayao Miyazaki talvez tenha sido o único a desenvolver uma filmografia totalmente autoral no gênero animação. Lembro de já ter lido em algum lugar, me perdoem mas não lembro onde, que ele seria de fato um diretor único, uma vez que ele não teve influência direta de nenhum outro cineasta que tenha feito o mesmo tipo de filme e dificilmente seu gênero deixará herdeiros. A Viagem de Chihiro (2001) se tornou seu trabalho mais aclamado pela crítica e o deu visibilidade no ocidente, o filme ganhou o Urso de Ouro, prêmio máximo do Festival de Berlim, e o Oscar de Melhor Animação. Neste longa Miyazaki retorna com brilhantismo à temática de Meu Amigo Totoro (1988), o seu quarto longa. Ambos têm seus focos direcionados para a infância e para os sonhos, medos e transformações inerentes à esta fase da vida.
A Viagem de Chihiro é considerado por muitos como uma releitura do clássico literário Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll, na história contada pelo filme, Chihiro acaba de mudar com os pais para uma nova cidade, no caminho para a nova casa eles se perdem e vão parar no que parece ser um parque de diversões abandonado. O curioso desta parte do filme, é que são os pais os curiosos para desbravarem o lugar e a menina a detentora da prudência, que a faz temer o desconhecido e ser excessivamente cuidadosa. Em meio a barracas e lojas abandonadas, eles encontram um restaurante em pleno funcionamento, porém sem uma viva alma lá. Os pais de Chihiro se fartam com a comida que está sobre as mesas, mesmo sendo alertados pela menina que se recusa a provar dos alimentos.
A noite chega rapidamente e algo muito estranho começa a acontecer, o lugarejo morto começa a ganhar vida, vultos estranhos surgem por toda a parte. Chihiro é então alertada por um garoto estranho que surge do nada e a aconselha a ir embora antes que seja descoberta, amedrontada a menina corre de volta para o restaurante e se depara com os seus pais metamorfoseados em porcos, eles já não a reconhecem mais. Envolta pelo que parece ser uma realidade paralela, Chihiro se recusa a acreditar que tudo aquilo é real, o menino estranho, chamado de Mestre Haku, aparece novamente e desta vez a aconselha a pedir emprego em uma espécie de casa de banhos para espíritos, que funciona no local, ele garante que isso a manteria a salvo das estranhas criaturas que habitam o lugar, que a tratam como um repudiante invasor.
Chihiro precisa então lutar contra os seus medos e contra si mesma para conseguir permanecer naquela realidade até que consiga um meio de libertar seus pais e escapar de tudo aquilo. As experiências da garotinha neste mundo novo funcionam como uma alegoria das descobertas da infância e do rito de passagem para uma nova etapa da vida (temas presentes também em Meu Amigo Totoro). Ela precisará tomar decisões, se responsabilizar por seus atos e se virar sem a ajuda de seus pais. A história é repleta de metáforas que simbolizam a arrogância, a ganância e a avareza da humanidade e até mesmo o desrespeito ao meio ambiente.
Em uma das sequências mais belas do filme, um espírito fedorento chega a casa de banho, todos empurram a tarefa de conduzi-lo à banheira para Chihiro, ela, com a ajuda de um outro ser misterioso, vence seu medo e encara o árduo serviço. Durante o banho, ela percebe que tem algo prezo no corpo daquele ser asqueroso. Contando agora com a ajuda de todos os outros, ela consegue desprender o objeto e junto com ele o espírito expele uma quantidade enorme de lixo e outros detritos. É então que todos descobrem que aquele não era um espírito do fedor e sim um deus dos rios. Em outra sequência a ganância leva alguns personagens a transformarem algo que era bom em uma força totalmente descontrolada, novamente Chihiro é única que não se deixa levar pelos impulsos que tomam os demais.
A sensibilidade e a sofisticação dos filmes de Hayao Miyazaki é algo indescritível, o que eleva seus trabalhos à condição de verdadeiras obras de arte. A predominante escolha pelos desenhos feitos com pincel e tinta, ao invés da computação gráfica, é uma prova disso. O mundo criado pelo realizador em seus filmes, remete às mais belas memórias de nossa infância, à simplicidade e às aventuras além das fronteiras do real, trilhadas pela nossa imaginação. Realmente é uma pena que o ocidente ainda não esteja preparado para suas obras, o que faz com a sensibilidade poética de seus filmes seja por vezes confundida com lentidão, o que leva alguns desentendidos a taxar o filme de chato. Eu acredito que só não é tocado por um filme como este quem não teve infância ou não tem coração! Ao assisti-lo preste atenção na qualidade magistral da animação e na belíssima trilha sonora composta pelo colaborador habitual de Miyazaki, Joe Hisaishi. Ultra recomendado!
A Viagem de Chihiro ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim
e o Oscar de Melhor Animação.
Confiram também aqui no Sublime Irrealidade a resenha crítica de
Meu Amigo Totoro, o segundo longa de Hayao Miyazaki
.
Fiz questão de assistir Viagem de Chihiro no cinema e estava com esperança de que daí pra frente toda produção dos Studios Ghibli fossem passar em nossas telas... acho que sonhei alto demais. Apesar de gostar muito de Chihiro, considero outros trabalhos de Miyazaki melhores, justamente pelas semelhanças de Chihiro com Alice e pelo final um tanto lugar comum depois de toda aquela odisséia surreal. Acabei de asssitir Arrietty e é novamente uma viagem pelo bom que um dia foi nossa infância. Abs!
ResponderExcluirhttp://atmosphera2hq.blogspot.com/
Gosto muito deste filme Bruno. Principalmente pelo toque poético. Obrigado por visitar meu blog e parabéns pelo seu, bem sacado e inteligente.
ResponderExcluirVou colocar o link do seu blog no meu.
Abs.
Flávio - www.oivalfnocinema.blogspot.com
E logico que é uma de varias obras de arte do mestre Miyazaki...assisti na sala prime de cinema do banco do Brasil e foi incrivél...obrigado pelo comentario pertinente,e por aprovar...tambem gostei muito da sua pagina e ja estou seguindo.
ResponderExcluirVolte quando quiser...será sempre bem vindo !
Oi J. Bruno, assisti a Viagem de Chihiro no cinema, em um dia em que levamos nossos alunos da escola pública, não sabia sobre o que era o filme, mas, eu e os alunos saimos do cinema encantados...
ResponderExcluirGostei muito das suas resenhas do Miyazaki. É difícil encontrar alguém que se aventure a lançar interpretações interessantes sobre os símbolos desse artista, e não se limite a comentar que ele cria histórias de fantasia ecológicas sem "bem" e "mal". Essa questão da alegoria das descobertas é realmente essencial. Escreva mais sobre Miyazaki!
ResponderExcluirEu acabei de assistir novamente mais de dez anos depois e me lembro como eu fiquei impressionada quando era crinça. Tambem acho esse filme bastante profundo, muitas mensagens subliminares.
ResponderExcluirEsse é um dos filmes que mais me marcaram, é lindo!
ResponderExcluirTambém gostei muito da mensagem de "O castelo animado", mas a Viagem de Chihiro ainda é meu favorito.
hum dos melhores que eu ja vih... :)
ResponderExcluirTive a experiência de passar este filme para meus alunos do sexto ao oitavo ano, fiquei admirada com o fato deles terem conseguido captar a essência do filme e interpretarem grande parte das metáforas presentes na história. Foi muito gratificante.
ResponderExcluirPelo menos 2 vezes por mes assisto esse filme, e a parte que me faz sempre refletir é quando ao meu ver Chihiro deixa sua infância pra traz, isso quando ela deixa a casa de banhos e vai atras da irma de Yubaba. Otimo filme! Com certeza passarei a minha filha quando tiver mais idade
ResponderExcluirPelo menos 2 vezes por mes assisto esse filme, e a parte que me faz sempre refletir é quando ao meu ver Chihiro deixa sua infância pra traz, isso quando ela deixa a casa de banhos e vai atras da irma de Yubaba. Otimo filme! Com certeza passarei a minha filha quando tiver mais idade
ResponderExcluirPara mim, A viagem de Chihiro tem um roteiro perfeito, bem redondinho. Contudo, ainda assim prefiro Princesa Mononoke. Em ordem, acho que os meus favoritos do mestre Miyazaki são:
ResponderExcluir1. Princesa Mononoke
2. A Viagem de Chihiro
3. O Serviço de Entregas da Kiki
4. Laputa
5. Meu Vizinho Totoro
P.S. Menção honrosa: Túmulo dos Vagalumes, que não é do Miya :D
A Viagem de Chihiro é um ótimo filme mesmo.
ResponderExcluir