Elysium - 2013. Escrito e dirigido por Neill Blomkamp. Direção de Fotografia de Trent Opaloch. Trilha Sonora Original de Ryan Amon. Produzido por Simon Kinberg. TriStar Pictures, Alpha Core, Media Rights Capital, QED International, Simon Kinberg Productions e Sony Pictures Entertainment / USA.
Em Distrito 9 (2009), seu filme anterior, o cineasta sul-africano Neill Blomkamp despertou a atenção do público e da crítica por conseguir, em um filme de ação, tecer contundentes críticas à desigualdade e à exclusão social. Através de metáforas muito bem construídas ele usou uma história de ficção científica, sobre invasão alienígena, para retratar os efeitos ainda existentes do Apartheid em seu país de origem. Mas, não sendo restrito à realidade específica da África do Sul, o filme acabou se tornando também uma metáfora do modelo de organização ainda vigente na maioria das grandes cidades, um modelo que culmina com o processo de favelização e com a formação de guetos, espaços não alcançados pelas políticas sociais, que se tornam uma espécie de refúgio para aqueles, uma grande maioria, que devido á própria condição se viu excluído do convívio com seus semelhantes.
Em Elysium (2013) o cineasta volta ao mesmo tema, abordando-o com a mesma inventividade, novamente o que ele nos apresenta é uma boa trama de ação e aventura, na qual as inúmeras referências às já citadas questões sociais acabam funcionando como uma denúncia à este modelo de organização, com isso ele abre margem para importantes reflexões sobre tais problemáticas e seus efeitos. O roteiro escrito por ele próprio nos conduz para uma realidade distópica, ambientada no ano de 2154, onde vemos reproduzidas algumas aberrações sociais decorrentes da ganância e da sede de poder alimentada por uma minoria que detém o controle social. Neste futuro sombrio, não tão distante da nossa própria realidade, podem ser percebidos inúmeros avanços tecnológicos, no entanto estes servem basicamente à duas funções: garantir os privilégios gozados pela minoria e exercer um controle social sobre a grande massa marginalizada.
Tais avanços tecnológicos possibilitaram a criação de uma plataforma espacial, a Elysium, um lugar restrito aos que detém o poder, um espaço livre da escassez e da violência que assolam a Terra e com a cura disponível para todas as doenças. Frequentemente expedições tentam invadir a plataforma, os nativos da Terra vão em busca do conforto que o lugar pode oferecer e da cura para males intratáveis. O planeta se transformou em uma espécie de colônia superpovoada capaz de oferecer mão de obra barata e os insumos necessários para a subsistência de Elysium; qualquer semelhança com a realidade de países do terceiro mundo não é mera coincidência, lembremos que o longa é na verdade uma contundente crítica a tal realidade - Como não ver nas incursões para a plataforma espacial uma clara referência à imigração ilegal para os países desenvolvidos? Como não relacionar as atividades da corporação retratada pelo filme à atuação de grandes multinacionais em países de condições econômicas, políticas e sociais instáveis ?
Desta opressora realidade surgem alguns heróis tortos, tão distópicos e condenáveis quanto o mundo ao qual pertencem. Diferente do herói trágico, cuja ventura era determinada por uma única falha de caráter, o herói distópico alcança alguma bem-aventurança devido à algumas poucas virtudes, que se destacam em meio à uma postura sujeita a ser condenada por diversos aspectos. Max (Matt Damon) e Spider (Wagner Moura) representam no filme este tipo de herói, o primeiro é um ex-ladrão de carros que se encontra em liberdade condicional, o segundo é o líder de um grupo de rebeldes que atuam como "atravessadores" entre a Terra e Elysium. Ambos se vêm envolvidos em uma mesma missão depois que Max sofre um grave acidente na fábrica em que trabalha, ele descobre que tem poucos dias de vida e decide ir para a plataforma espacial em busca de cura...
O reencontro de Max com Frey (Alice Braga), uma amiga de infância, faz com que ele questione suas motivações e prioridades e a situação muda completamente depois que ele e Spider descobrem que têm a posse de algo tão poderoso que é capaz de transformar a realidade nos dois mundos. Este mesmo poder é cobiçado pela cruel Delacourt (Jodie Foster), a responsável pela segurança de Elysium, ela, que planeja um golpe de estado contra o atual governante, alicia na terra o mercenário Kruger (Sharlto Copley), para realizar cá embaixo todo o seu serviço sujo (a composição de Kruger faz referência às autoridades de países pobres, que sacrificam os interesses de sua própria gente devido à subserviência aos interesses dos dominantes). Apesar de ter algumas pequenas reviravoltas, a trama se desenrola sem tanta ousadia ou experimentalismo, o que nos faz lembrar de estamos diante de um mero filme de ação, cuja a proposta é apenas proporcionar um entretenimento inteligente, dando ainda uma pequena margem para uma grande reflexão.
Esperar de Elysium um tratado filosófico sobre a desigualdade social e a determinação das relações de poder é sem sombra de dúvidas um grande erro, esta definitivamente não é a sua proposta, o que fica evidente no tipo de ritmo que ele adota: rápido e pontuado por sucessivas cenas de combate físico. A trama peca, não por evitar o aprofundamento nas questões abordadas, mas por se render em alguns momentos a clichês que pouco contribuem para a narrativa e à sequências de notável apelo emocional, que não funcionam com tanta naturalidade. Isso certamente prejudica o filme, mas não o torna uma obra ruim ou descartável, afinal de contas o que se sobressai, tal como em Distrito 9, é a sua relativa diferenciação em relação às demais produções de seu gênero, o que corrobora a ideia de que o entretenimento para funcionar como tal não precisa ser desprovido de significações maiores e de inventividade.
Todo o elenco entrega boas atuações, convincentes e com arestas bem aparadas, Wagner Moura, contudo, vai além, ele empresta ao seu personagem trejeitos e maneirismos que enriquecem sua composição e fazem com que ele roube a cena em cada um dos momentos em que aparece, sua entrega à interpretação justifica cada um dos elogios recebidos por ele no Brasil e no exterior. O que também chama a atenção no filme é o visual, e isso acontece principalmente nas passagens nas quais são salientadas a pobreza e a devastação da terra. Trent Opaloch, que também fotografou Distrito 9, entrega aqui um excelente trabalho, que aliado à direção de arte, ajuda a compor um conjunto de imagens que remete a um futuro distante mas sem perder o link com a realidade de nossa própria época. O tom predominantemente amarelado e/ou metalizado, remete à pobreza, ao domínio exercido através da tecnologia e à escassez de água e de vegetação, o que reforça a impressão do quão inóspito é aquele lugar.
Elysium não merece ser visto apenas pela presença dos atores brasileiros, pensar desta forma seria negligenciar tudo aquilo que ele pode nos oferecer, seria portanto puro reducionismo. Ele vale a pena também pelo bom entretenimento que nos oferece (sua duração de quase duas horas passa em um piscar de olhos) e também pela reflexão que ele ao menos incentiva... Volto afirmar, Neill Blomkamp não é um dos melhores cineastas da atualidade, mas seu trabalho merece muito ser acompanhado bem de perto.
A revelação das passagens aqui comentadas não compromete a apreciação da obra.
Confiram também aqui no Sublime Irrealidade a crítica de Distrito 9,
também dirigido pelo Neill Blomkamp.
Confiram também aqui no Sublime Irrealidade a crítica de Distrito 9,
também dirigido pelo Neill Blomkamp.
Esse filme está em minha lista de prioridades, Bruninho! Não somente pelo fato de ter Wagner Moura, confesso! Mas, por ter Matt Damon, que eu curto tantão! :D
ResponderExcluirbjks :*
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